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PUC-Rio
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Jornal/Revista: ISTO É Data de Publicação: 20/10/2004 Autor/Repórter: Ivan Cláudio
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PANO PARA A SAIA
Rede Record tenta repetir o sucesso global com uma nova versão de escrava Isaura
Entre as duas mil peças do figurino de A escrava Isaura, novo folhetim da Rede Record, com estréia prevista para a segunda-feira 18, às 18h45, as chamadas saia-balão, com seu rodado de inúmeras pregas, são ao mesmo tempo motivo de orgulho e de reclamação do elenco feminino. Orgulho porque, se comparadas às peças usadas por Lucélia Santos na versão global de 1976, as saias de Bianca Rinaldi - a ex-paquita escolhida pelo diretor Herval Rossano para viver a escrava branca, educada na casa-grande - trazem um rodado mais generoso e fiel à época enfocada pelo autor Bernardo Guimarães. No esforço de criar um padrão Record de qualidade, o farfalhar dos linhos, cetins e veludos é um signo a ser considerado. A parte do sacrifício diz respeito ao desconforto em usar a vestimenta, que, somada às calçolas, saiotes e cintas, chega a pesar 20 quilos. Para manter a estrutura em equilíbrio, é preciso enfiar na cintura uma armação chamada crinolina. Antigamente, explica o figurinista Cesar Dante, um dos inúmeros profissionais que a Record desfalcou da Rede Globo, ela era feita de barbatana animal, bambus e ferro. Agora, foi improvisada com fitas de aço, pesando entre três e quatro quilos.
A armação permite que a saia se infle até um diâmetro de 1,20 metro. Imagine, então, a dor de cabeça que tem sido para as atrizes lembrar o texto e passear entre cadeiras, aparadores e prateleiras sem causar estrago na cenografia e na banda sonora. Na sexta-feira 8, enquanto Bianca gravava, no estúdio M, na Barra Funda, em São Paulo, a cena 34 do capítulo 21, o temido aconteceu. Não com a protagonista, mas com Maria Ribeiro, que interpreta Malvina, a mulher do vilão Leôncio, agora encarnado por Leopoldo Pacheco. A cena se passa na cozinha da casa do comendador Almeida, vivido por Rubens de Falco, o antigo vilão no folhetim global. Malvina se queixa a Isaura de que Leôncio só tem olhos para a escrava. No embalo, ao se aproximar de uma cadeira, seu lamento de sinhazinha é interrompido pelo ruído do móvel, jogado para longe sob o peso dos frufrus. No segundo esbarrão, Maria pede a Rossano que mude a marcação. "É foda puxar essa cadeira. Posso sentar antes, enquanto ela fala?" Pedido atendido, mal sabia a atriz que o constrangimento aconteceria horas depois, na cena em que agride com panelas e louças o marido Leôncio. Desta vez, um paneleiro completo é que foi abaixo.
As quedas repentinas não causam nenhum sobressalto no tarimbado Herval Rossano, também diretor da novela global, exibida em 79 países e durante muito tempo a mais vendida da Rede Globo. Antes de cada cena, ele passa o texto com os atores e - não se sabe se por experiência ou urgência na gravação - como um enxadrista define as posições das quatro câmeras digitais Ikegami HD, o máximo em tecnologia televisiva. "Câmera 4 ali, câmera 2 aqui, câmera 3 ali e câmera 1 aqui", ordena como general, antes de abandonar o estúdio e se dirigir ao switcher, de onde comanda a equipe pelo ponto eletrônico. Ele faz questão de lembrar que A escrava Isaura atual não difere da outra apenas pela presença do artigo no título. "Esta é baseada exclusivamente no livro. A outra era pouco livro e muito Gilberto Braga (autor do texto)", explica. A julgar pela avaliação que hoje faz do trabalho anterior, a refilmagem - aventada no passado pela própria Rede Globo - não era só urgente, mas necessária. "Não me lembro de Escrava Isaura. É a novela de que menos gosto, prefiro Maria, Maria", afirma Rossano, que, no entanto, está utilizando Retirantes, de Dorival Caymmi, o mesmo tema usado pela Globo. "Ela não tem qualidade. Usamos um equipamento inferior. Nos Estados Unidos, eles até perguntaram se a noite brasileira era azul. Puro erro de fotometria."
Segundo Rossano, além das melhorias técnicas - que fizeram cada capítulo custar R$ 250 mil -, outras estão sendo postas em ação, especialmente em relação ao estilo de interpretação. Mesmo assim, os atores tiveram dificuldade em alguns diálogos mais castiços. Na cena em que é assediada pelo impulsivo Henrique (Gabriel Gracindo), cunhado de Leôncio, Bianca trocou a palavra arroubo por um "quase" palavrão, motivo de riso geral da equipe técnica. Experiente ator teatral, Leopoldo Pacheco esbarrou várias vezes na fala em que repreende o mesmo Henrique, flagrado roubando um beijo de Isaura. "Até parece um fauno, um sátiro agarrando a ninfa", disse, por fim, na cena de ciúme, que não fica em nada a dever aos acessos do Leôncio do passado.
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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 103312