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Jornal/Revista: Jornal do Brasil Data de Publicação: 08/03/1990 Autor/Repórter: Cristina Iori
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TV ABRIL FAZ ACORDO COM MTV
Canal em UHF entra no ar entre julho e setembro
SÃO PAULO - A TV Abril, que entre julho e setembro deste ano irá ocupar o canal 32 de São Paulo, em UHF, já tem uma cara definida e essa cara é idêntica à da MTV americana, uma emissora de TV por assinaturas dedicada ao público jovem que se transformou numa das idéias mais bem sucedidas dos anos 80. Na manhã de ontem, em entrevista coletiva, foi anunciado um acordo entre a TV Abril e a MTV Records, uma multinacional que já espalha sua idéia por 33 países e é assistida por 91 milhões de pessoas.
O esquema, no Brasil, será o mesmo dos outros pontos do mundo onde chega a MTV: uma programação à base de videoclips, durante todo o dia, com rigores máximos de qualidade, temperada por animações e vinhetas computadorizadas, grafitis que ganham movimento, programas onde só os esportes radicais são admitidos. Além disso, um jornalismo muito diferente do convencional, tratando de idéias de ponta, como a ecologia, agrupamentos urbanos jovens ou world music. A TV Abril não vai se contentar em espalhar a linguagem videoclip apenas em São Paulo: promete se expandir em rede por todo o Brasil.
Mas quem pensa que vai ter diante de si um monitor reprodutor de clips da indústria fonográfica vai ficar assustado. Porque no Brasil ninguém teve acesso, ainda, à controvertida cultura videoclip, rápida demais e feita de extremo rigor técnico. A TV Abril precisou cumprir toda uma bateria de exigências para conseguir os direitos de retransmissão da marca, pelo prazo de cinco anos, através de um acordo onde o dinheiro envolvido é ainda o maior segredo.
"Confiamos na Abril porque é uma empresa que entende e respeita o valor da marca", diz na coletiva de ontem a vice-presidente executiva da MTV Records, Sara Levinson. "A Abril já trouxe para cá dezenas de marcas, como a Playboy e Cosmopolitan (no Brasil, revista Nova), além de todos os produtos Disney, com imenso sucesso. Ela não vai errar agora." Para garantir o padrão de qualidade, um videoclip transmitido pela TV Abril terá som estéreo - mesmo - e melhor qualidade de imagem, já que as cópias serão originais ou até exclusivas da MTV
O ruído de fundo dessas transmissões será 30 vezes menor do que estamos acostumados a ouvir em fitas. E mais: 50% da programação da emissora terão que ser produzidos aqui, de acordo com a lei federal que regula as transmissões de TV. Por isso, a TV Abril vai incentivar a produção, no Brasil, de clips com artistas. Ela própria vai produzir clips, além de gravar shows ao vivo - "de início, só com os grandes nomes", informa o diretor gerente da TV Abril, Marcos Amazonas.
De quebra, os músicos brasileiros ganharão a chance de competir no mercado fonográfico de todo o mundo. Isto porque a MTV aproveita dentro do mercado americano os clips produzidos em suas filiais, conseguindo, assim, eliminar um dos seus maiores problemas: a repetição diária da programação, que já lhe causou séria crise econômica, forçando-a a se expandir - primeiro em direção à Europa, em 1987, e depois para a Austrália e Japão. A empresa continua crescendo. Este ano, além da MTV no Brasil, há planos para implantação de uma emissora na União Soviética. A cultura videoclip avança.
Quando fez seus primeiros planos para entrar na mídia eletrônica, há três anos, a TV Abril concebia para si mesma um perfil mais modesto. Seria uma TV por assinaturas, local, sem muitos concorrentes à vista, já que os outros canais em UHF de São Paulo ou dedicam-se a importar programações inteiras de emissoras americanas, sem nenhum recheio autóctone, ou vão especializar-se em jornalismo e serviços. "No entanto, montar uma emissora é caro demais para termos objetivos tão modestos", diz Roger Karman, o capo da TV Abril e vice-presidente da Editora Abril. Até agora, já foram gastos no projeto US$ 15 milhões, calculando-se que o custo total chegará a US$ 20 milhões. "Com esse custo, teremos que nos comportar como uma rede de TV'', diz Amazonas. Assim, a emissora, que tem duas concessões em UHF - os canais 32, de circulação aberta, gratuita e sustentada por publicidade, e o canal 24, de circulação por assinaturas - vai operar apenas com o UHF aberto, o canal 32. A ele terá acesso, só em São Paulo, um público potencial espalhado por quatro milhões de domicílios com TV.
Se esse canal atingir 1 ponto de audiência, serão 40.000 pessoas. "Queremos ter entre 1 ou 2 pontos de audiência, no início", diz Amazonas. Mas já se prepara a expansão, através de satélite - a empresa comprou um canal no satélite Brasilsat 2 -, além de acordos de afiliação ou concessão de licenças com emissoras de outras cidades e estados, além de retransmissores, que serão instalados, "no tempo certo", segundo Amazonas, em vários dos principais centros urbanos do país. "O ideal é que, em julho, a TV Abril entre no ar em São Paulo e Rio", diz Amazonas.
Roger Karman hesita em apontar o maior concorrente da TV Abril. Nega, no entanto, que a TV Globo se chocaria com ela num primeiro momento. "É um absurdo pensar que poderíamos concorrer com a Globo, que abocanha 70% de todo o mercado dessa mídia, avaliado em US$ 800 milhões", pondera Karman. "Queremos apenas 2% desse mercado." No entanto, a Globo também tem um canal em UHF, a Paulista Metro, que poderia acabar com os planos de expansão da Abril. "É um absurdo pensar que a Globo, com todo o mercado que já possui, ganhe do governo federal ainda um canal em UHF", protesta o diretor da Abril. Até agora, Karman e os outros 50 profissionais da TV Abril continuam em compasso de espera. Aguardam a chegada de equipamentos importados, o término da reforma do prédio onde a emissora vai funcionar, no bairro paulistano do Sumaré, e preparam com cuidado a entrada no país de uma linguagem televisiva jovem que, pelo mundo a fora, acabou virando um estado de espírito.
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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 11733