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Jornal/Revista: O Estado de S. Paulo
Data de Publicação: 28/09/2009
Autor/Repórter: Ubiratan Brasil

NÓS QUE AMAMOS LUCY

Considerado o avô dos atuais sitcoms, seriado I Love Lucy chega ao DVD com humor preservado

Entre outubro de 1951 e abril de 1960, um estranho fenômeno acontecia nas principais cidades americanas nas noites de segunda-feira, precisamente entre 21 horas e 21h30: o índice de criminalidade caía, as grandes lojas fechavam suas portas, o consumo de água reduzia. O motivo era um programa exibido pela rede de televisão CBS em que Lucy, uma ruiva atrapalhada, envolvia o marido (o cantor cubano Ricky Ricardo) e os vizinhos Ethel e Fred nas maiores confusões: I Love Lucy, pioneiro dos sitcoms (abreviação de comédia de situação) que conquistou o público graças ao carisma de sua protagonista, Lucille Ball, responsável por um longo caso de amor com a América. Basta conferir qualquer um dos 36 episódios da primeira temporada que a Paramount envia para as lojas na quarta-feira (R$ 129,90 a caixa).

A escolha não será fácil. Tanto pode ser O Balé, em que Lucy é uma desajeitada aspirante a bailarina, como Lucy Faz um Comercial de TV, em que ela interpreta a garota-propaganda do tônico Vitameatavegaminem (veja detalhes nesta página). "A fórmula do sucesso era simples: um roteiro que não insultava a inteligência e divertia toda a família. E, principalmente, uma atriz com um fenomenal dom para a comédia", comenta Gregg Oppenheimer, responsável pela edição do DVD nos Estados Unidos, que aconteceu em 2000. Os fãs da série identificam o sobrenome - ele é filho de Jess Oppenheimer, o produtor que convenceu a CBS a apostar no programa de TV em uma época em que o rádio e o cinema dominavam a atenção do público. Jess, aliás, buscava inovar e apostou alto, pois cada episódio era gravado por três câmeras que se movimentavam em um cenário fixo e diante de uma plateia ao vivo, para garantir a autenticidade das risadas. E, no projeto que apresentou à emissora, Jess foi sucinto: "Um programa de tevê com um cantor latino-americano e sua mulher. O desejo dela é entrar para o show biz; o dele - igualmente forte - é de impedi-la."

Esse fio condutor consagrou a atriz de cinema e rádio Lucille Ball (1911-1989), até então conhecida como a Rainha dos Bs, referência aos filmes de segunda linha de que participava. Com suas caretas e gestos, ela se tornou o protótipo da dona de casa que, apesar de se meter em confusões, sempre preservava o casamento. Lucille, aliás, lutava também pelo seu na vida real, pois insistiu pela contratação do marido, o cubano Desi Arnaz, conhecido no meio artístico como mulherengo e canastrão - como assumiu a produção da série através de sua empresa Desilu, Lucille garantiu para ele o papel de Rick Ricardo.

"Lucy era durona nos bastidores e não se considerava engraçada", conta Gregg, que conheceu a atriz quando, com 5 anos, visitou o estúdio. "Ao mesmo tempo, tinha uma grande imaginação e trabalhava arduamente, pois tinha horror a improvisos." Tal declaração, aliás, soa irônica ao se assistir o episódio piloto, que abre o primeiro disco do pacote. Em um cenário capenga, que balança a cada fechar e abrir de portas, o que se sobressai é o talento de Lucy, apesar da extensa participação de Desi tocando com sua orquestra.

O sucesso, porém, foi instantâneo e tão intenso que, durante a segunda gravidez de Lucille, no fim de 1952, episódios antigos foram readaptados para que a série não saísse do ar - foi a primeira vez que a tevê americana usou o videoteipe. Ao todo, I Love Lucy ganhou quatro prêmios Emmy (o Oscar da TV), além de liderar a audiência em quatro das seis temporadas. "Mesmo depois de encerrada, a série sobreviveu mais quatro anos, com edições especiais", conta Gregg. "Lançou ainda o caminho das futuras sitcoms ao apostar em histórias pouco realistas."

A fama também trouxe problemas e levou Lucille ao comitê anticomunista, em 1953, que questionava seu apoio ao PC americano na eleição de 1936. A defesa veio no episódio 68 (The Girls Go Into Business) em que Desi, mirando as câmeras, afirmou: "O único toque vermelho de Lucy é seu cabelo e, mesmo assim, não é legítimo."

NA TV BRASILEIRA

. De 1958 a 1979, foi exibido pela TV Tupi

. Durante os anos 1980, foi a vez da TV Gazeta

. Em 1994, I Love Lucy foi exibido pela TV Cultura, que o reprisou também em 2001

. Em 2002, entrou na programação do canal pago Multishow

. Desde 2005, o seriado é mostrado por outra emissora paga, o TCM

AS IMPERDÍVEIS

. As garotas querem ir a uma boate: Lucy e Ethel querem dançar, mas os maridos preferem o boxe.

. Piloto perdido: A produção é tosca, mas Lucy como palhaço é impagável.

. Mulheres pioneiras: Lucy luta contra a massa de um pão gigante.

VERSÃO NACIONAL REPETIU SUCESSO - Alô, Doçura! formou outro casal, Eva Wilma e John Herbert

O enorme sucesso de I Love Lucy na TV Tupi de São Paulo logo inspirou o surgimento de uma versão nacional, Alô, Doçura!, a primeira sitcom brasileira, escrita e dirigida por Cassiano Gabus Mendes e exibida, entre 1954 e 1964, pela mesma emissora, que veiculava o original americano.

Estrelado por Eva Wilma e John Herbert (que logo formaram um casal na vida real), o seriado tinha o mesmo ponto de partida: os desencontros de marido e mulher na cidade grande. Além do seriado americano, Gabus Mendes aproveitou um programa criado por seu pai, Otávio, para o rádio.

Curiosamente, os primeiros episódios foram interpretados por Eva e outro ator, Mário Sérgio, na época o grande galã da empresa cinematográfica Vera Cruz. Como ele logo abandonou o papel, Gabus Mendes decidiu arriscar ao convidar Herbert, pois sabia que ele já namorava Eva Wilma - sua esperança era que a química entre eles se transferisse para o seriado.

Com o sucesso em São Paulo, o programa ganhou uma versão na Tupi do Rio de Janeiro com o título Alô, Querida!, com Haydée Miranda e Paulo Maurício. Logo o casal foi trocado pelo mesmo do seriado paulista, obrigando Eva e Herbert a viajar muito para o Rio, onde o programa também era ao vivo.

E, assim como Lucille Ball, Eva Wilma se afastou do seriado quando ficou grávida, substituída por Marly Bueno. Alô, Doçura! fez tanto sucesso que a fórmula voltou a ser testada nos anos 1990 pelo SBT, com Virgínia Novick e César Filho. O resultado final, no entanto, ficou muito abaixo do original.

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 158539