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Jornal/Revista: Jornal do Brasil
Data de Publicação: 31/10/1992
Autor/Repórter:

AS MALUQUICES DE UMA ADORÁVEL TRAPALHONA

Rose Esquenazi

Os fãs da atriz norte-americana Lucille Ball costumam dizer que "em algum lugar do planeta, a qualquer momento do dia, alguém está assistindo I love Lucy." Parece que eles têm razão. Até aqui no Brasil, onde o seriado não está sendo exibido em nenhuma emissora, o público ainda pode rir das maluquices de Lucille e de seu marido Desi Arnaz. Onde? Em rotas nacionais da Varig, que brinda seus passageiros com alguns dos programas criados nos anos 50. Nos Estados Unidos eles também são reprisados e adorados mesmo depois de três anos da morte da rainha da comédia pastelão.

Lucy chegou à TV através do cinema, onde foi considerada também uma rainha, só que dos filmes B. No começo da carreira era apenas uma das Goldwyn girls, aquelas louras de pernas bonitas que se exibiam ao lado de dezenas de outras, verdadeiros clones que repetiam o tempo todo os mesmos gestos. Foi também garota propaganda até decidir pintar os cabelos de vermelho e emendar um depois do outro 23 filmes de qualidade duvidosa.

No programa de rádio My favorite husband (Meu marido preferido), os produtores descobriram o talento da atriz para o humor visual. Daí para a TV foi um pulo. Mas Lucille fez questão de incluir no elenco o marido Desi Arnaz, um cantor cubano que havia emigrado para os Estados Unidos, onde fundou uma banda de rumba. Os episódios em preto-e-branco, de meia-hora, eram gravados ao vivo com a presença da platéia, algo totalmente original na época. De 1951 a 1974, I love Lucy - primeira série familiar da história da TV americana - foi um grande sucesso em todo mundo.

O argumento era, em parte, autobiográfico. Um chefe de banda e sua mulher atrapalhada que desejava entrar para o show-business enfrentavam juntos e de forma caótica o cotidiano, com todos os seus problemas e questões. Seus vizinhos, interpretados por Vivien Vance e Gale Gordon, ajudavam a inventar tramas mirabolantes, ingênuas, mas muito engraçadas. "Acho que as pessoas gostavam de Lucy porque ela era bonita e, mesmo assim, fazia comédia pastelão, em situações recusadas por outras atrizes", explica Fred Sill, americano que trabalha no Brasil. "Ela fazia a mulher meio burra que falava besteiras e era muito distraída. O tipo que bebia licor achando que era água, ficando, é claro, bêbada."

Lucille e Desi ficaram muito ricos desde que decidiram fundar a Desilu Productions. A partir daí tinham absoluto controle de seus episódios de TV. Foi também uma grande idéia optar pelos filmes ao invés do kines-copes de curta durabilidade. Graças a isso eles existem até hoje. Outros seriados deram prosseguimento ao primeiro programa da dupla: The Lucy show, Here's Lucy e o último e fracassado Life with Lucy. Nessa série de 1986 a atriz já tinha 75 anos e chegou aos estúdios avisando que estava pronta para fazer extravagâncias, como deslizar sobre uma escada de rodinhas. As caretas eram as mesmas mas a graça ficou no passado. Madelyn Davis, escritora que acompanhou grande parte da carreira de Lucille, afirmou no primeiro dia de gravação que ninguém iria fazer a estrela voar. A resposta de Lucille foi rápida: "Ah, mas eu sou capaz de voar". Esse mesmo tipo de certeza fez com que a jovem estudante não desse a mínima ao que seu professor de artes dramáticas lhe disse quando era mocinha: "Você deve ir para casa e se casar. Você não foi feita para o show business."

No Brasil, Lucille Ball chegou nos anos 60 em filmes legendados, para satisfação do público da Tupi. Isso porque, anos mais tarde, o SBT voltou a exibir I love Lucy, mas acabou com o bom humor dublando todos os personagens. Um mês antes de morrer de ataque cardíaco, a atriz compareceu à entrega do Oscar, onde viu, mais uma vez, como era querida. Se a ruiva tivesse levado em conta os conselhos do velho professor, não se tornaria milionária nem conquistaria tantos fãs em todo mundo.

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 19605