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Nova Consulta

Jornal/Revista: Jornal do Brasil
Data de Publicação: 06/11/1993
Autor/Repórter: Marília Martins

''RENASCER'' DEU AULA DE DIREÇÃO

A novela Renascer chega aos últimos capítulos. E hora de balanço. De cara, sobressai o trabalho de direção de Luiz Fernando Carvalho, que desde os primeiros capítulos marcou um diferencial diante do costumeiro jogo de câmeras; das novelas globais. No lugar da monótona sucessão de closes, o foco do diretor se fez sentir nos enquadramentos surpreendentes, quer nos hipercloses em bocas e olhos, quer em ângulos tirados pelas frestas, ou no rastejar da câmera pelo chão. Mais do que isto: a novela apresentou um trabalho de fotografia, assinado por Walter Carvalho, como raras vezes se viu na TV, e cujo mérito maior foi o fato de nunca ser gratuito, de estar em diálogo permanente com o texto de Benedito Ruy Barbosa.

Direção e fotografia se mostraram quase sempre afiados na transcrição do texto em termos de imagens, levando a paisagem seca e agreste do Nordeste brasileiro a virar personagem da trama, mais do que mero cenário. Tal entrosamento foi, sem dúvida, muito mais relevante do que os eventuais exageros, que levaram a novela, numa ou noutra cena, a se aventurar por uma perigosa estetização da miséria. A sujeira e a feiúra marcaram presença apenas em cenas antológicas como a de amor entre Tião Galinha e sua mulher em meio à lama.

A trama de Benedito Ruy Barbosa, repetição em diferença de Pantanal, se pautou por mão dupla: de um lado, extremo conservadorismo na análise de comportamentos (que se pode medir, por exemplo, na domesticação da personagem hermafrodita Buba e da menina de rua, Teca); do outro uma instigante discussão de temas políticos considerados tabus na TV, como a reforma agrária. Neste aspecto, o paralelismo entre os dois pactos com o demônio - o bem sucedido, do coronel José Inocêncio, e o trágico-picaresco, do desastrado peão Tião Galinha -, que tem raízes fundas no anedotário popular brasileiro, se revelou uma excelente armação para o enredo da novela, bem mais eficiente do que os conflitos de um pai soberano e seus filhos rebeldes, retomada invertida do enredo de Rei Lear, de Shakespeare.

Se a trama de Benedito não suportou ambigüidades no tocante ao comportamento dos personagens no âmbito familiar, revelou-se ousada na abordagem das contradições sociais, sobretudo se se tiver em conta a rígida censura habitual à teledramaturgia. Seguiu um padrão próximo dos romances sociais de Jorge Amado, tanto sucesso de público, com a diferença de dar menos ênfase aos apelos sexuais e mais atenção a um certo clima de misticismo brasileiramente ecumênico. Entre os atores, além da impecável Chica Xavier, destacaram-se o sóbrio coronel de Antônio Fagundes, a detalhada composição do sírio Rachid, por Luis Carlos Arutin, e o carisma de jovens atores como Marcos Palmeira, na pele do filho preterido João Pedro, e Patrícia França, na pele de Santinha.

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 23342