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PUC-Rio
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Jornal/Revista: Olho Mágico Data de Publicação: 01/01/1980 Autor/Repórter: Sílvia Donato
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SÍLVIO SANTOS: ENQUANTO ELES FALAM, EU TRABALHO
Esta é a primeira e certamente será a única entrevista que Sílvio Santos concedeu, fazendo uma análise de todos os assuntos ligados aos seus onze órgãos de comunicações, ou sejam, suas três emissoras de rádio e oito de televisão.
- Sílvio, como você encara as críticas, nunca respondidas, que o acusam de ser o "rei dos programas enlatados", em prejuízo da mão-de-obra nacional?
- Dizem que eu só uso enlatados, mas ninguém ainda se deu ao trabalho de pegar a minha programação semanal e a das outras emissoras de televisão, para um confronto na ponta do lápis. E isso o Governo fez. Quando apresentei a licitação e entrei na concorrência, demonstrei ao Governo que em meu estúdio de produção, situado na Via Anhangüera (com mais de 30 mil metros quadrados de área construída), mais meu estúdio de gravação no Carandiru, mais minha equipe da Record, e mais meu estúdio do Rio, estava fazendo 76 horas de produção ao vivo, semanais, contra 72 da Globo (na época), que agora está fazendo menos, e contra 56 da Bandeirantes. Então esse negócio de dizer "que o Sílvio só faz enlatado, ou' melhor, só apresenta enlatado "é porque ninguém ainda se deu ao trabalho de começar a contar.
Para você ter uma idéia, só O Povo na TV, são 22 horas e trinta minutos semanais; o meu programa são mais nove; Reapertura, mais uma e trinta; Sargentelli, mais uma hora, mais Bozo, Raul Gil, Almoço com as Estrelas, Jacinto, noticiosos, arte culinária, ginástica, e por aí vai. Essa mesma conta fiz para o Governo. Os que me acusam ainda estão se baseando no comecinho do Canal 11, no Rio, quando então, em fase de experiência, só usei enlatados.
- Você já tem planos para a sua programação na TV Tupi de São Paulo?
- A única coisa que sei é que será uma programação ao vivo, muito boa, com tudo que for possível, mas quais os programas que vou lançar, ou conservar, da atual programação, não sei, porque não trabalho a longo prazo, só a curto prazo. Hoje está dando certo,' dando audiência, vai. Amanhã não dá nada disso, sai. Só trabalho em ritmo veloz. Se amanhã eu começar na Tupi, já tenho tudo pronto, mas se for daqui a sete, quinze dias, já terei outra programação, porque vou mudando conforme as necessidades do mercado, dos patrocinadores, da audiência. Estou prevendo 10 horas diárias, ao vivo, de programação, mas posso no dia da estréia colocar sete, oito, dependendo da estratégia da programação. Mas não vou divulgar algo que de hoje até a estréia já posso ter mudado, sem falar que é melhor manter o público curioso, querendo saber o que o Sílvio vai mostrar.
- Quais seus planos com relação às emissoras que recebeu no Rio, Belém do Pará e Porto Alegre?
- Ainda não entrei nos detalhes de programação dessas emissoras porque ainda não há uma definição total sobre elas. Eu não gostaria de conservar a emissora do Rio, porque lá já tenho a TV S. Para que posso querer dois canais no Rio? Já em São Paulo a coisa é diferente, Tupi e Record são duas empresas diferentes, mesmo porque, quem ganhou a concessão não fui eu, foi minha cunhada e o filho do Paulo de Carvalho, embora todo mundo saiba que de fato fui eu. Eu não tenho condições de dirigir duas no Rio e duas em São Paulo, porque eu estaria fazendo concorrência comigo mesmo. O meu interesse é ficar sozinho em São Paulo, vendendo minha parte da Record para o Paulo ou outra pessoa qualquer. O Paulo Machado de Carvalho é um excelente sócio. Na Record eu cuido da parte comercial, técnica e administrativa, e ele cuida da programação artística, justamente a parte que mais gosto de fazer. Tenho meu C.P. (Centro de Produção) e a Tupi, em São Paulo, de onde gerarei os programas para as outras emissoras, inclusive 'Rio. Minha luta toda foi para ganhar mais meia-estação, porque meia eu já tinha na Record.
- Você está deixando a Record por que ela não é estável?
- Pelo contrário, estamos em segundo lugar de audiência, com uma renda de 150 milhões mensais. Fechamos o ano passado com um lucro de 250 milhões. Meus amigos que conhecem esses detalhes, acham que eu sou burro, já que vou deixar uma emissora estável como a Record, com 450 torres no interior do Estado de São Paulo, para enfrentar problemas de tudo que é ordem. Vou ter que lutar por um faturamento que já tenho, por uma segunda colocação, que já tenho.
- Por que lutou tanto para ganhar, mesmo que fosse mais meia emissora de TV?
- Eu ficaria contente do mesmo modo se tivesse ganho apenas a Tupi de São Paulo, porque isso representa a minha liberdade na criação da parte artística, que vem a ser uma luta para ampliação do mercado de trabalho. Não dá para entender quando alguns jornalistas dizem que não abro mercado de trabalho, quando meu centro de produção vai funcionar 24 horas por dia, em quatro turnos, fazendo programas não só para minha rede, mas tanbém para quem quiser. Se a Globo quiser alugar meus estúdios, tudo bem, se quiser fazer um programa em co-produção, estamos aí, se quiser comprar programas feitos por minha produção, tudo certo. Faço programa para a Globo e para quem quiser, qual é o problema? Terei três mil funcionários nesse centro de produção que poderão vir do Rio, de Porto Alegre, e, de onde for, enfim. Assim como estamos na Anhangüera, poderíamos estar com o C.P. em Belém do Pará, por que não? Eu até poderia morar em Miami e vir a Belém (três horas de vôo) fazer meus programas. Compreendeu meu objetivo?
- Sílvio, seus planos para seu Grupo estão me parecendo imediatistas. Você não estruturou nada em definitivo, não sabe que linha vai atacar mais, se jornalismo, novelas, humorísticos, musicais?
- Acompanhe, Silvia, meu pensamento. Quando vi que o programa Aqui e Agora, na Tupi, estava se comportando bem, fui e contratei o Wilton Franco e criamos o Povo na TV. Pronto. Para que vou agora me preocupar? De nada me adianta achar que serão as novelas que me trarão compensações. A novela "Espantalho" foi uma prova, criou-me uma situação difícil, então acabei com ela. Se novela vai ser bom para mim, para os patrocinadores, o público e os atores, fazemos novela. Qual problema? O mesmo com humorísticos, musicais, jornalismo. É só ir mudando os cenários, as pessoas. O que é que muda? Amanhã novela não dá, vamos ao jornalismo, contratando mais profissionais, comprando mais câmeras portáteis, mais carros com microondas. Para que me preocupar com o que vou fazer amanhã, se não sei o que o povo vai querer? Essa tem sido minha luta semanal, nestes 22 anos, com um único domingo fora do ar, quando morreu minha primeira mulher. Baixou a audiência, modifico. Pronto.
- Sílvio, pode ser que essa estrutura funcione para um programa de TV, de nove horas, como o seu, mas para uma rede de emissoras de televisão, a coisa me parece frágil...
- Não, porque essa estrutura não vai ser montada na estação, e sim no meu Centro de Produção. Não vou fazer uma novela para cada canal, mas uma só, que será distribuída pela Rede, em cassetes ou em fitas. E o que é melhor, eu posso mudar tudo, em 48 horas. A carpintaria que faz cenários para um musical, fará para as novelas. O departamento artístico que está contratando cantores, vai contratar jornalistas e atores. Isso tudo não é nenhum bicho-de-setecabeças. Sou imediatista, mas meus resultados são positivos, porque simplifico tudo. No Rio, a TVS é a segunda colocada, mesmo quando havia a Tupi. No horário das nove às 13 horas, somos primeiro colocados ganhando da Globo. Não sei se por sorte, por boa estrela, se pelo toque de Midas que dizem que eu tenho, tudo isso não importa, mas a verdade é está dando certo e não vou mudar, não vou agora começar a planejar para 1982, 85, 90.
- Existem pessoas, como o caso do Walter Clark, por exemplo, que são tidas como gênios, que pedem tempo para colherem os resultados, que programam a longo prazo, programas esses que custam milhões às contratantes. Essa gente está fazendo charme, se. supervalorizando?
- Minha equipe de produção foi treinada para trabalhar em ritmo acelerado, e trabalhar bem. Walter Clark tem tudo planejado, planificado e queira Deus que dê certo. Por enquanto não deu, embora ele não tenha tido muito tempo. As outras direções não deram certo, o mesmo acontecendo com a Tupi. Por meu processo tenho tido lucro, audiência, tranqüilidade, minhas empresas estão aumentando, para que me afobar? É verdade que agora estou tendo um pouco mais de trabalho, mas logo, logo, me organizo de novo e não vou mais ter trabalho. Tudo isso por quê? Porque estou mais estruturado, aprendi a trabalhar com rapidez.
- Para contratar grandes nomes para sua Rede, você pretende ir até ao ponto de inflacionar a mercado de trabalho?
- Jamais inflacionei o mercado. Quando contrato um artista procuro pagar o justo e por trabalho executado. Se um autor escreve três programas, ou três novelas, ao mesmo tempo, para mim, ele recebe três salários, em contratos separados. Eu sou artista, eu sou empregado, e eu continuo no palco com meus colegas. Tanto isso é verdade que quando alguém quer falar com o dono de uma emissora, ele tem que ir ao 8° andar, se entender com a secretária. Já comigo não, meu comportamento é outro. As pessoas falam comigo no palco, eu recebo todo mundo. Por ser artista e empresário, quero direitos iguais. Não preciso ganhar mais com sacrifício de meus colegas. Se dou trabalho para três mil funcionários, preciso cuidar para que minha empresa continue a dar trabalho para essas três mil pessoas. Para mim, hoje, significa muito continuar a trabalhar. O empregado deve ganhar o justo por seu trabalho, nem demais, nem de menos, para que nenhum dos dois seja prejudicado. Quando uma empresa prospera, ela precisa dar o máximo em conforto, em condições de trabalho e em salários, para o funcionário, porque ele é quem passa mais tempo lá, saindo de casa às sete e voltando às 19 horas, ele merece isso. Eu poderia estar viajando por aí, mas tenho que cuidar das minhas empresas para os meus colaboradores. Também, se eu não trabalhasse, estaria fazendo o que?
- Você tem planos para expandir-se também na área de rádio?
- Foi bom você falar nisso. A Rádio Record está em primeiro lugar de audiência. Seus índices diários são maiores que as outras emissoras de rádio juntas, aqui em São Paulo. Comprei a Tupi do Rio, que já está paga, mas ela tem que ser entregue a mim pelos condôminos, mas eu não sei o que eles vão fazer. Cumpri todas as cláusulas contratuais e os contratos. Estou esperando eles entrarem no Ministério das Comunicações com um pedido de transferência para o meu nome. Se eles não pedirem, não sei como vai ficar, mas a Rádio Tupi é minha. Tenho então a Tupi, a Record e a FM Record, que não vou vender. Não pretendo também vender a TV São José do Rio Preto, a de Franca, a de Jaú, a de Friburgo, a Tupi de São Paulo, a TV S do Rio, mas vou me desfazer da minha parte da Record e procurar vender a outra emissora do Rio. Trabalhar em rádio não me faz vibrar.
- Sílvio, para terminar, você quer dizer mais alguma coisa, responder à alguma ofensa, algum ataque?
- O pessoal fala, porque quer falar, e eu deixo eles falarem, porque enquanto eles falam e falam, eu trabalho e os resultados estão aí. Falar não adianta, o que adianta é trabalhar. O resultado está aí, com uma vitória atrás da outra, um sucesso seguindo o outro. Se isso acontece comigo por capacidade profissional, por sorte, por ter uma boa estrela, não sei, mas não esqueçam que se' existe a inspiração, também existe a transpiração. Posso ser bem inspirado, mas transpiro no trabalho, dou duro, não fico em casa nem ando por aí só gozando a vida. Continuo na luta porque lutando estarei dando trabalho para meus companheiros.
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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 3033