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PUC-Rio
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Jornal/Revista: O Estado de S. Paulo Data de Publicação: 08/11/1998 Autor/Repórter: Ricardo Alexandre
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CARLA PEREZ TROPEÇA NA AMBIÇÃO
Ela poderia fazer bom uso do que ganhou, mas quer mostrar talento em bombas como 'Fantasia'
Veja como é a vida. Algumas fábulas modernas se desenrolam bem nos nossos narizes e nem é preciso esperar sua conclusão para saber a moral da história. Hoje, para animar seu domingo, vamos a uma parábola sobre a picaretagem e a ambição.
Carla Perez é uma pós-adolescente que se beneficiou da condescendência histórica da mídia em relação a tudo o que vem da Bahia. Bacana. Ganhou notoriedade em um conjunto musical, embora não tocasse, não cantasse e não compusesse nada. Tudo bem. Era "dançarina", embora estivesse longe da arte de Fred Astaire - na verdade, sua "dança" limitava-se a esfregar constrangedoramente os glúteos nas câmeras de TV. Beleza. Posou nua para revistas masculinas, embora não seja exatamente bonita e sua desproporção física seja o maior "atrativo" nesses tempos de freakshow televisivo. OK. Virou celebridade sem ser capaz de articular duas frases e, sem cacoetes de atriz, estrelou um filme equivocado desde o título (Cinderela Bahiana), que deve entrar com louvor para a história do trash brasileiro. Tudo certo.
Alguém de boa alma deveria ter sugerido a la Perez que investisse tudo o que ganhou em imóveis, em gado ou em franquias do McDonalds. Mas não. Ambiciosa, resolveu provar que, ora bolas, ela também tem talento! E o resultado dessa tragédia grega está no ar desde domingo, no inacreditável Fantasia Com Carla Perez, do SBT.
Difícil imaginar porque cargas d'água alguém possa querer ver Fantasia quando se tem a opção de ler um livro, dormir ou chupar tachinha. O programa consiste em "brincadeiras" com o telespectador, que entra no ar, ao vivo, pelo telefone. A linha cai, alguém chama a mãe para falar com a apresentadora ou não escuta direito, tudo conspirando para que a pobreza da produção fique mais evidente. De cenário e direção a apresentadoras, tudo é amador.
Ah, há as atrações musicais, que dão um toque todo novo ao Fantasia. Banda Beijo, grupo de axé music aeróbica, Dominó cantando uma música de título auto-explicativo, Dam Dam Déo, e Fat Family que, após ajudar a afundar a campanha de Paulo Maluf (sacou? gordinhos, peso, afundar...) deu uma força a Carlinha. Passa.
Carla tem voz desafinada e entrou mexendo tanto as mãos que fez lembrar os inimigos do Ultraman. Sua presença de palco, em resumo, consiste em repetir "É isso aí", "O prazer é meu" e a dar trancos na cabeça para jogar o cabelo para o lado.
Mas o apogeu ficou, espertamente, para o final, em um desconcertante quadro em que Carla surge rodeada de crianças, necessariamente mais articuladas que ela. Conversam um pouco, dançam um pouco, o quadro termina e a gente não descobre para que ele serve.
Débora Rodrigues, a vice-apresentadora, mostra muito mais simpatia que a companheira. Carlinha, daqui a um ano, talvez se torne uma apresentadora viável. Eu é que não quero estar lá conferindo.
Moral da história: Não há o menor problema em ser um picareta; o problema é não se contentar com a própria picaretagem. Sub-moral: Não há Complexo Anhangüera no mundo que comporte tantos programas medonhos como os que o SBT está empenhado em enfileirar em sua programação
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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 41162