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Jornal/Revista: Jornal do Brasil
Data de Publicação: 29/08/2001
Autor/Repórter: Gabriea Goulart

NOVELAS COM GRIFE

Globo investe em trama moderninha e SBT adapta dramalhão mexicano

TV Globo estreou anteontem As filhas da mãe, novela das 19h com grife de Silvio de Abreu. Conseguiu 39 pontos de audiência, ficando acima da média do horário, algo em torno de 34. No mesmo dia, o SBT estreou Pícara sonhadora, novela das 20h com grife de adaptação de trama mexicana da emissora Televisa, potência na produção do gênero. Conseguiu 18 pontos de audiência, mesma média do dramalhão legítimo Café com aroma de mulher. Guardadas as proporções e expectativas, a Globo fez o que se esperava dela e o SBT idem. Nada além. Nada a mais.

Silvio de Abreu optou pela comédia leve - consagrada como regra para a faixa das 19h - sustentada por atores do primeiro time da emissora (Francisco Cuoco, Fernanda Montenegro, Tony Ramos, Regina Casé, só para citar os que tiveram mais destaque no primeiro capítulo). Em vez do pastelão, seguiu o caminho clean. As filhas da mãe tem abertura de marionete, incursões pela internet, rap para contar partes da história, figurinos que beiram o fashion e trilha sonora cult.

Linguagem - Para mudar a trama de país, a cena de As filhas da mãe é rasgada como se fosse página de história em quadrinho. Para ir e voltar no tempo ou amarrar situações, a linguagem lembra cinema. Às vezes alternativo. Aquele que corta um quadro aqui e emenda com um diálogo ali, sempre com algum gancho ou referência. Às vezes mais tradicional. Aquele que muda a plasticidade da imagem, com o passado em textura diferente.

As filhas da mãe quer ser moderninha. Foi pensada para isso. Foi caprichada para isso. E, nesse capricho, peca pelo excesso. O rap cantando o perfil dos personagens a cada cena cansa na terceira ladainha, quando o telespectador não sabe se presta mais atenção no que está sendo falado ou visto. O recurso de usar a câmera para o personagem falar com o telespectador aproxima e diminui a informalidade, fica sem propósito. Sobra até. Funciona melhor no pastelão. E As filhas da mãe não é pastelão. Também tem drama.

Nada que se compare ao uso que Pícara sonhadora faz desse elemento da dramaturgia. Lá, o drama está em cada música que embala cada cena. Na tarefa de abrasileirar a trama mexicana, o SBT não esqueceu de nada. Nem a mecha loura no cabelo da matriarca da família Rocfield, proprietária da loja de departamentos Soles - perfeição de nomes, aliás -, ficou de fora. Muito menos a bondade excessiva da mocinha.

Drama - A tal pícara mora em uma loja de departamentos, trabalha de dia para estudar de noite, fica apaixonada pelo mocinho-playboy-rico - que até o fim vai virar mocinho-redimido-rico por causa dela - e transgressoramente usa as coisas da loja, mas anota tudo em um caderninho para pagar quando ficar rica. Ela é pícara - astuta, esperta -, mas é sonhadora.

Tudo bem tradicional. Até porque, tudo que o SBT não quer é uma novela moderninha. Em Pícara sonhadora, quando a trama muda de lugar, o nome da cidade aparece em letras prateadas. Quando há passagem de tempo, o flashback é no convencional preto-e-branco esfumaçado.

''Você troca de cama como quem troca de sonhos'', diz mexicanamente o tio para a pícara, depois que ela muda mais uma vez a cama em que dorme no setor de móveis. O principal problema da primeira novela méxico-brasileira do SBT se dá quando os atores - outro problema da trama, franco contraste com o primeiro time que se exibe às 19h na Globo - abrem a boca. O texto soa absurdo. Como uma novela mexicana traduzida.

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 71967