PUC-Rio

Jornal/Revista: O Estado de S. Paulo
Data de Publicação: 04/08/1996
Autor/Repórter: Eduardo Elias

A SEDUTORA QUER SER BOA MOÇA

Ex-musa de Caetano, consagrada como ''Divina Magda" na Globo, ela acha seu rumo no SBT como a garota de programas de ''Razão de Viver", mas se diz cansada do eterno papel de loira fatal

Vera Zimmermann interpreta a polêmica Sílvia, a prostituta de luxo da novela Razão de Viver, do SBT. Não chega a ser novidade. A palavra polêmica define bem a carreira da atriz desde o seu primeiro trabalho na TV, na novela Vida Nova, de 1987 - em que também interpretava uma prostituta dividida por sua vida dupla.

Quando ainda saia da adolescência, em 1980, ficou conhecida como a musa que inspirou Caetano Veloso a compor a canção Vera Gata. Mas a projeção nacional e a afirmação como atriz só vieram em 1991, como a Divina Magda de Meu Bem, Meu Mal. Sua especialidade na trama em levar ao delírio o mordomo Porfírio (Guilherme Karan).

A chegada ao SBT foi no ano passado. Contratada para atuar em Sangue do Meu Sangue, esperou, esperou e não entrou. A audiência despencou, a novela mudou de autor e Vera ficou de fora. A estréia na nova emissora só ocorreu este ano, oito meses depois, em Razão de Viver.

Aos 32 anos, a paulista Vera ainda deixa transparecer um leve sotaque gaúcho - assimilado durante a infância em Porto Alegre. A afinidade com os pampas pode ser confirmada nos finais de tarde, quando a atriz troca tudo por uma boa cuia de chimarrão.

Estado - Sílvia é mais uma personagem polêmica em sua carreira. Como você a define?

Vera Zimmermann - Ela leva uma vida dupla. Trabalha numa confecção durante o dia e, à noite, faz programas com homem mais velhos. É ambiciosa, quer dinheiro e poder. Por isso, faz michês de luxo. Ela não se envergonha: quer se dar bem a qualquer custo. E consegue: vai chegar a conseguir o cargo de gerente de produção da Luzia (Irene Ravache).

Estado - Você foi contratada para fazer Sangue do Meu Sangue e ficou de fora. Foi constrangedor?

Vera - Foi. Fiquei agoniada. Você se prepara para um trabalho, dizem que vai entrar no capítulo 30, depois no 59, já estava com a personagem pronta e aí mudou o autor, mudou tudo. Fiquei ansiosa e com uma expectativa muito grande. No fundo, foi bom: a novela teve um monte de idas e vindas, confusões que não acontecem em Razão de Viver.

Estado - Apesar de ter ficado de fora, você continuou recebendo normalmente?

Vera - Claro. As pessoas até brincavam que eu tinha o melhor contrato do SBT, porque ganhava sem trabalhar. Todo mundo ralando e eu lá, na folga. Mas foi chato. Deixei de fazer a peça Don Juan, com o Gerald Thornas, só para me dedicar à novela... E aí não fazia nada. Não podia me comprometer com trabalho nenhum porque, a qualquer hora, o SBT poderia me chamar. Mas a gente tem de aprender a lidar com isso. O ator é muito ansioso. Passei pelo grande teste da angústia.

Estado - Depois de tudo isso, você não esperava uma personagem de peso, com mais importância em Razão de Viver?

Vera - Já cheguei a achar que a Sílvia estava sem gancho na novela Agora, estou sentindo que os autores encontraram um cantinho melhor para ela. Todo ator sente falta de cenas com fundamento, que tenham objetividade. Fiquei com o pé atrás no começo da história Mas agora a Sílvia está crescendo. Já nos próximos capítulos, ela vai conhecer o Mário (Gabriel Braga), com quem vai ter um romance. Ele vai saber que ela faz programas.

Estado - Como você se preparou para viver uma prostituta de luxo?

Vera, - Não estava programado que Sílvia seria uma garota de programas. Mas como ela era muito ambiciosa, os autores acharam melhor, na última hora, incluir essa característica. Eu me preocupei em representar o sentimento dela, uma coisa ruim, mesquinha que a gente vê muito por aí. Mas ela tem um lado humano. Só um. O carinho pela irmã.

Estado - Seu papel mais conhecido na TV continua sendo o da Divina Magda, de Meu Bem Meu Mal, da Globo...

Vera - Foi o papel que mais me destacou, sucesso nacional mesmo. Mas não era uma participação grande, ao contrário, tinha só uma cena por capítulo. Foi marcante porque as pessoas achavam engraçado. Era o momento de humor no meio de uma novela densa. Entrava aquele palhaço, o Guilherme Karan, que era ótimo, falando bobagem, e eu falando bobagem. Foi um sucesso.

Estado - A Sílvia tem muito em comum com a Magda?

Vera - Até hoje nunca interpretei personagens normais, como a Bruna ou a Zilda. Por normal chamo aquela que é boazinha, certinha, legal, que sofre muito. Acho que inspiro os autores. Tenho até vontade de fazer unia desse tipo "normal". Por nunca ter feito. Estado - A personagem de seus sonhos então é unia boazinha?

Vera, - Não. É uma que tenha o oposto do meu tipo físico. Tenho vontade de fazer uma mulher decadente, pobre, rural, uma mendiga. Interpreto sempre a sedutorazinha fatal, porque sou loira, de olhos azuis.

Estado - Você usa a beleza para ajudar na carreira?

Vera ~ Não é bem assim. Separo as coisas. Você tem de se desenvolver como atriz, estudar, estar sempre atenta a tudo. É claro que eu entendo que cada tipo físico se encaixa num determinado papel. Se tivesse outro tipo, teria outra personagem. Não vou negar o rosto e o corpo que tenho - mas também não vou deixar a estética em primeiro lugar. Eu batalhei muito. Às vezes, me convidam para papéis bobocas que não é o tipo de coisa que quero fazer. Quero trabalhos sérios.

Estado - Seu currículo mostra que você trabalhou com dois dos mais conceituados diretores teatrais, Antunes Filho e Gerald Thomas.

Vera - É com essas pessoas que aprendo. Já que não temos bons cursos no Brasil, gosto de trabalhar com grandes diretores, para aprender o que eles têm de melhor.

Estado - O que você tirou de cada um deles que mais contribuiu para sua formação?

Vera - Quando comecei a trabalhar com Antunes era uma menina. Tinha, 17 anos, havia feito teatro amador, mas não sabia o que queria da vida. Foi um pontapé, como se tivesse entrado um gênio no meu ouvido, me passando conhecimento. Talvez não tenha absorvido nem metade. Já o Gerald foi uma outra fase. É fascinante como as pessoas do grupo dele se entregam. É muito espontâneo, muito do improviso é um exercício maravilhoso. Mas isso isoladamente não me serve. Me serve como uma fase.

Estado - Você ficou conhecida com a música Vera Gata, do Caetano. Como aconteceu?

Vera - Foi minha primeira projeção em revistas e jornais. Eu fiquei amiga do Caetano quando ia para Salvador. Tinha 16 anos e comecei a namorar o iluminador dele. Depois, a gente saiu umas vezes e ele fez a música para mim. Nem era nada sério.

Estado - E ele era casado na época.

Vera - Era, mas eles já não estavam juntos. Era uma época de amizade colorida, uma galinhagem total.

Estado - Com 16 anos e namorando o Caetano, que terminaria fazendo uma música para você. Não ficou deslumbrada com tudo aquilo?

Vera - Eu não. Ele me disse que tinha gravado e eu dizia: "ah, tá''. Quando a música saiu, ele até achou que eu não tinha gostado. Só quando comecei a dar entrevistas é que saquei como era importante.

Estado - Você tem se encontrado com ele?

Vera - Nos encontramos em shows, festas. Temos muitos amigos em comum.

Mas faz tempo que eu não vejo o Caetano.

Estado - O que você faz quando não está gravando ou ensaiando no teatro?

Vera - Acabei de filmar um média metragem com a diretora Lina Chamiecom: Tônica Dominante. No elenco estão também a Vera Holtz e o Fernando Alves Pinto. Além disso, faço exercícios todos os dias - quero evitar problemas, porque se não se cuidar dança mesmo. E viajo todo final de semana para meu sitiozinho na serra da Bocaina para cuidar dos meus cavalinhos.

Estado - E tem tido tempo para namorar?

Vera - Claro.

Estado - Quem é?

Vera - É segredo.

Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 106998