PUC-Rio

Jornal/Revista: O Globo
Data de Publicação: 16/03/2006
Autor/Repórter: Amelia Gonzalez

TRAMA ENVOLVE O PÚBLICO NAS AVENTURAS DO HERÓI

A história é boa. “Cidadão brasileiro”, novela que estréia o horário nobre da teledramaturgia na Rede Record propõe-se a acompanhar, durante mais de 50 anos, a vida de Antônio Maciel (Gabriel Braga Nunes), um homem comum que se mete em encrencas porque não pode ver um rabo-de-saia. Afinal, foi justamente este fraco por mulheres que fez o herói criado pelo autor Lauro César Muniz se deixar levar pela conversa da aventureira Faustina, ou Fausta (Lucélia Santos), logo no primeiro capítulo, que começa em 1955.

A cena em que a vilã prepara seu golpe contra o pobre coitado permite que o público perceba o que vai acontecer antes de Antônio. Funcionou bem. É uma boa estratégia para prender a atenção do pessoal da poltrona. Começaram assim a saga de Antônio e a novela, que, por estratégia da emissora, teve duração de uma hora sem intervalo comercial tanto no primeiro quanto no segundo capítulos. A estréia marcou uma média de 15 pontos e o segundo capítulo, 13.

Emissora conseguiu montar um bom elenco - Por ter entrado maciçamente no mercado da teledramaturgia, a Rede Record conseguiu montar um bom elenco para se aventurar no horário nobre. Gabriel Braga Nunes virou a prata da casa e está levando a sério o trabalho. Criou um Antônio com a dose certa de ingenuidade, esperteza e malícia com as mulheres.

Por enquanto, porém, a química de Braga Nunes com Carla Regina, a Carol, uma das mulheres com quem o personagem vai ter um relacionamento amoroso, não está dando muito certo. A atriz, a outra prata da casa, está sendo excessivamente caricatural para forçar a imagem de jovem sedutora e ingênua. A cena em que ela morde uma maçã enquanto diz que o rapaz precisará ter medo dela explica bem o excesso.

A veterana Lucélia Santos é outra que ainda não encontrou o tom certo para interpretar a vigarista que se aproveita do fogo do jovem Antônio para dar um golpe em Atílio, o deputado de Guará interpretado por Floriano Peixoto. Formando a família de Atilio, Cleide Yáconis como Joana, Cécil Thire como Júlio, Paloma Duarte como Luíza e Bruno Ferrari como Marcelo formam um núcleo interessante que promete boas cenas, sobretudo porque as falas de Yáconis são sempre muito engraçadas. Paloma Duarte, embora tenha feito poucas cenas até agora, protagonizou um dos melhores momentos no segundo capítulo, quando conversava com o pai, Júlio. Foi uma química que deu certo.

Cenas muito lentas: um problema - Há problemas em “Cidadão brasileiro”. O que mais incomoda é a morosidade da maioria das cenas, sobretudo as de amor entre Antônio Maciel e Carol. Os personagens ficam longo tempo explicando tudo, como se o público não tivesse participado da história. E contam as tramas com riqueza de detalhes. Fica muito clara a impressão de que a edição de Flavio Colatrello está penando para preencher os 60 minutos estratégicos.

Outro problema é o caráter ainda pouco definido do herói. Não se sabe se ele é do bem ou do mal. Se na vida real isto não é necessário, na ficção é preciso. Afinal, o público tem que saber por quem torcer.

Houve também uma surpresa em “Cidadão brasileiro”. Celso (Leonardo Brício) sai da prisão e diz ao pai, Nestor (Gracindo Júnior), e ao irmão Emílio (Rubens Caribé) que quer “comer uma mulher”. Até onde se saiba, é uma linguagem pouco comum ao público de novelas.

A trilha sonora é um antídoto para o espichamento dos capítulos. E, como é uma novela de época, possivelmente não vai acontecer com ela o exagero do marketing social que se vê em “Prova de amor”, a outra novela da casa. Ali os personagens às vezes passam um bloco inteiro levantando questões como a falência do sistema penitenciário brasileiro ou o descaso das autoridades com a população infantil de rua. Em altas doses, o efeito das boas causas pode ser o contrário do esperado.

Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 118266