PUC-Rio

Jornal/Revista: Jornal do Brasil
Data de Publicação: 16/09/1995
Autor/Repórter: Vera Jardim

SANGUE NOVO NO SBT

Emissora substitui escritor e tenta tirar escritor da TV Plus para salvar sua novela

Reviravolta no SBT. Sangue do meu sangue tem novo autor e pode ganhar outro diretor nos próximos dias. A crise provocada pela insatisfação da emissora com a baixa audiência, e do pai da obra, Vicente Sesso, 62 anos, com a adaptação feita por Rita Buzzar e Paulo Figueiredo, provocaram uma intervenção na novela, que custa ao SBT cerca de US$ 42 mil por capítulo. Sesso ameaçou recorrer à Justiça para tirar a trama do ar caso a emissora não fosse fiel ao seu texto, e a direção decidiu afastar Paulo Figueiredo e Rita Buzzar e convidar o próprio autor para continuar o trabalho. A confusão é tão grande que, segundo boatos, a emissora poderia escolher um novo escritor ou mesmo encerrar a novela antes do prazo previsto.

Luciano Callegari, superintendente artístico do SBT, garante que a emissora busca um consenso. "Já que o autor diz que a adaptação não está correta, achamos que ele deveria assumir a novela." Callegari avisa que o SBT tinha base jurídica para impedir que a obra fosse tirada do ar, mas preferiu evitar uma batalha. "Como dono da obra, ele deve ter razão."

O superintendente do SBT acredita que o problema teria sido evitado caso Sesso tivesse aceito o convite inicial da emissora para adaptar a história. O autor admite a recusa, mas nega que o entrave tenha sido financeiro. "Me ofereceram apenas R$ 4 mil, mas o motivo real foi que eu não dependo mais do Brasil para trabalhar", alega Vicente, que agora interfere para preservar sua obra.

Sesso pretende fazer alterações no que chama de casa desarrumada, referindo-se ao trabalho de Rita e Paulo. Eliminar personagens criados pelos adaptadores e incluir novos atores no elenco estão entre as possibilidades. Foi cogitado o nome de Tônia Carrero, que viveu Pola Renon na primeira versão e agora interpretaria Ceci, cunhada de Pola. Callegari, porém, garante que qualquer mudança depende de autorização da direção do SBT.

O imprevisível pode funcionar como recurso para melhorar a audiência de oito pontos obtida pela novela, contra uma expectativa inicial de 10 pontos. Mas a grande cartada poderá ser a contratação de Jayme Monjardim, que dirige A idade da loba para a Bandeirantes. "Estamos apenas fazendo acertos de ordem financeira", esclarece Callegari. O SBT também encomendou uma pesquisa à Retrato Consultoria e Marketing para que o público aponte erros e acertos da remontagem. "A partir daí, vamos tentar corrigir."

MUDANÇAS IRRITARAM O AUTOR

A insatisfação de Vicente Sesso com a adaptação de Sangue do meu sangue começou já no primeiro capítulo, exibido dia 11 de julho. "A linha dos personagens estava longe da história que escrevi", conta o autor, que reclamou do trabalho de Rita: Buzzar e Paulo Figueiredo, gerando uma troca de insultos. "A Rita Buzzar disse que eu era Magadan, não trabalhava há muito tempo e estava querendo aparecer", reclama Sesso.

A briga pela imprensa incomodou a emissora, como admite Luciano Callegari. "A empresa concorda que ele roteirize a novela, mas não endossa as referências deselegantes que ele fez ao elenco, à produção e aos adaptadores." Segundo o superintendente, Paulo Figueiredo e Regina Buzzar entenderam a posição da emissora. "Eles só se sentiram ofendidos com as declarações de Sesso que leram nos jornais."

Uma das principais reclamações de Sesso diz respeito a uma mudança. de enfoque da história, dos dramas pessoais para a luta pela abolição. Outras discordâncias se referem a alguns personagens, embora ele garanta que não duvida do talento dos atores. "A Pola Renon deveria ser interpretada por uma atriz mais velha, como Irene Ravache, para que a diferença de idade entre ela e Lúcio ficasse evidente."

Sesso diz que sua novela estava sendo pulverizada. "Um mesmo capítulo tem cenas de três capítulos anteriores. A novela está sendo escrita fora de ordem, e eles estão tentando salvar a história na edição.'' Para o autor, uma novela de época não admite muitas mudanças. "Sangue do meu sangue, exibida em 1969 na TV Excelsior, tinha inicialmente 30 minutos por capitulo, mas com o sucesso, a partir do 30°, a novela ganhou mais 15 minutos. Portanto, não tinha motivo para os adaptadores alterarem tanto a história."

Com o filho de volta ao colo, Vicente Sesso espera aumentar o ibope da trama. "Meu esforço é para que o campo de trabalho aberto pelo SBT não se feche", garante. E, tentando minimizar a fama de encrenqueiro, manda um recado. " As pessoas que são novas na TV têm o direito de errar, e devem tentar novamente".

ADAPTADOR CRITICA OS ORIGINAIS

Paulo Figueiredo e Rita Buzzar evitam aumentar a confusão, mas se dizem perplexos com a conduta de Vicente Sesso. Os adaptadores de Sangue do meu sangue se defendem das acusações do autor, justificando as modificações feitas na história original. "Quando se faz o remake de uma novela não dá para, simplesmente, copiar o que está escrito no original", esclarece Paulo. Segundo ele, as mudanças foram feitas em função da quantidade e da qualidade dos capítulos originais. "A história deveria ter 240 capítulos. Mas recebemos a obra faltando 20 e alguns estavam ilegíveis". Outra alteração foi aumentar o número de páginas dos capítulos originais de 15 para 50.

Paulo acredita, porém, que o problema poderia ter sido resolvido de forma democrática. "Não houve a intenção de desmerecer a obra do sr. Vicente Sesso. Ele poderia ter resolvido tudo diretamente com a gente." Rita Buzar lembra que o SBT não teve problemas do gênero com outras remontagens. "Autores como Lauro César Muniz, por exemplo, que escreveu As pupilas do senhor reitor, não vivem de obras do passado e sim do presente", alfineta.

Mas os argumentos sobre as alterações no texto vão além. "A novela foi escrita ha 26 anos. Hoje, a estética e os recursos da televisão são diferentes. A linguagem atual também é mais agilizada", define Paulo Figueiredo, que, porém, não considera definitiva sua saída e a de Rita Buzzar da roteirização.

Rita atribui a Vicente Sesso o inicio da briga. "Foi ele quem procurou os jornais para chamar a atenção". Para ela, mais grosseiras ainda foram as criticas do autor a alguns dos atores. "Indiscriminada e injustamente, ele disse, por exemplo, que a Lucélia Santos na novela era uma escrava Isaura velha". Desencantada, Rita garante que nunca mais fará uma adaptação de novela.

Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 50786