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PUC-Rio
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Jornal/Revista: O Estado de S. Paulo Data de Publicação: 30/03/2003 Autor/Repórter: Leila Reis
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‘AGORA É’ RECICLA OUTRAS VELHAS HISTÓRIAS
Realismo fantástico e coronelismo, utilizados várias vezes na Globo, marcam a novela das 6
Dá gosto ver a reprise da novela O Cravo e a Rosa à tarde. Elenco afiadíssimo, personagens bem esculpidos, figurinos bem talhados, um humor delicioso, uma historinha bem contada e, acima de tudo, simplicidade. Não é por acaso que a novelinha da hora do almoço tem registrado a apetitosa média de 22 pontos no Ibope. Ou seja, só 6 pontos a menos do que a inédita Agora é que são elas, que acaba de estrear.
Há muito tem se falado e escrito sobre a decadência do gênero, mas as novelas estão longe de encerrarem sua carreira. A ficção em capítulos diários tem fôlego para mais algumas décadas. A prova está na leitura dos números da audiência. As médias registradas são consistentes; Mulheres Apaixonadas faz 41 pontos, O Beijo do Vampiro, 31, Agora é que são elas, 28, e até a mexicanóide A Pequena Travessa é orgulho do SBT com seus 15. Ou seja, há um público fiel para todos os tipos de trama. Em uma estimativa grosseira, a soma da audiência de cada uma dessas novelas bate nos 10 milhões de telespectadores só na Grande São Paulo.
Mas, como o gênero tem 40 anos de existência – em 1963, Tarcísio Meira e Glória Menezes já namoravam (por telefone, afinal ela era presidiária e naquela época eram comuns as ligações cruzadas) no dramalhão 2-5499 Ocupado –, é meio inevitável que a originalidade fique um pouco comprometida.
Ao que parece, o público não está preocupado com isso. Assim como as crianças (que adoram a repetição), esse telespectador quer ver um triângulo amoroso bem formado, embates entre os mocinhos e os vilões, e muitos romances paralelos como em tantas outras novelas que já prestigiou.
No primeiro capítulo de Agora é que são elas, o espectador já pode desconfiar que a heroína Léo (Débora Falabella) não vai terminar com o galã Pedro (Maurício Mattar), mas com o filho do inimigo de sua mãe. E que o ódio de Juca Tigre (Miguel Falabella) por Antônia (Vera Fisher) é uma camada que encobre o amor não correspondido.
Claro que há um segredo, disputas pelo mesmo homem, maldades gratuitas e protestos bem-intencionados. A novela das 6 é uma colagem de vários clichês e de experiências já veiculadas na mesma Globo.
Juca Tigre é uma versão contemporânea do prefeito Odorico Paraguaçu, O Bem Amado escrito por Dias Gomes e interpretado magnificamente por Paulo Gracindo. O realismo fantástico também é filho de Dias Gomes – que o inaugurou na época da TV em preto e branco com Saramandaia – e que foi reeditado em outras novelas de Aguinaldo Silva e Ricardo Linhares, tais como Pedra sobre Pedra, A Indomada e Fera Ferida. Não por acaso, placas de sinalização rodoviária colocam Formigas na rota das também fictícias Greenville, Tubiacanga e Porto dos Milagres no capítulo de estréia de Agora é que são elas. É Linhares assumindo a reciclagem de trabalhos anteriores.
Portanto, não é de admirar a adesão à nova novela. Depois do imbróglio do Sabor da Paixão (cuja média foi de 24 pontos), o público parece estar gostando de pisar em terreno conhecido. Ele não se importa com clichês, só quer divertir-se com uma história que, de algum modo, faça sentido. Mesmo que cometa a inverossimilhança de colocar a explosiva Vera Fisher no papel de uma pacata senhora da roça.
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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 86861