PUC-Rio

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Documento Número: 22618
Jornal/Revista: Folha de S. Paulo
Data de Publicação: 10/07/1993
Autor/Repórter: Felipe Fortuna

CRÍTICO DE TV SE ASSEMELHA A UM TRISTE PANFLETÁRIO

Deixemos de lado, pelo menos hoje, a penosa tarefa que nos cabe, a de criticar programas da televisão brasileira. E passemos a comentar sobre quem recebe as mensagens e tenta interpretá-las com o aparelhamento de uma cultura que não é apenas, felizmente, televisiva. O crítico de televisão, muito mais do que o crítico de qualquer outro assunto, assemelha-se a um triste panfletário sem leitores: muitas vezes, escreve para aqueles que não vêem a programação. Mais triste do que lançar uma campanha de estímulo à leitura pela televisão. E, para piorar, os críticos ainda se expõem ao elitismo dos que consideram a "máquina de fazer loucos" um objeto indigno da interpretação.

A televisão provocou a curiosidade dos críticos e intelectuais desde que surgiu, mostrando na telinha o espelho de uma sociedade que abandonava a primazia da palavra. Um dos primeiros a escrever sobre o fenômeno foi o francês Emmanuel Berl, que teve reunido recentemente, em "Un Teléspectateur Engagé" (François Bourin), as crônicas que escreveu a partir de 1954. Sua produção se estendeu até 1971, ao mesmo tempo em que publicava romances, livros de ensaios e de história.

Berl se interessava pelos problemas de criação artística da televisão, quase sempre relacionados aos aspectos técnicos do veículo. A comparação da novidade com o rádio foi inevitável, e o autor salientou que a televisão não é um rádio ilustrado porque "transforma tudo o que transmite". No início dos anos 50, já se configurava uma tacanha realidade virtual, uma vez que Berl reclamava de um cantor reduzido a 15 centímetros de altura na tela em preto e branco, porém com uma voz mais amplificada que a de Caruso. O grotesco da transformação jamais permitiria avaliar a qualidade da imagem e do som ou seja, a qualidade da televisão.

Emmanuel Berl também reclama que, enquanto o cinema se dirige a um público reunido numa sala, como se estivesse participando de uma cerimônia, a televisão se dirige a indivíduos isolados. Obviamente, ele se refere à experiência pessoal de um telespectador, não à imensa população que assiste diariamente aos programas. Para Berl, "nenhum modo de expressão torna tão gritante, tão odiosa a mentira". E arremata: "Esta é a televisão cuja potência consigo sentir, sem compreender os seus meios e as suas regras". O que poderia ter pensado sobre a fidelidade da televisão à mensagem que transmite se ele tivesse analisado uma campanha eleitoral patrocinada pelos donos de televisão?

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 22618