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Jornal/Revista: ISTO É
Data de Publicação: 25/04/1979
Autor/Repórter: Berta Sichel, Nunzio Briguglio e Ricardo Kotscho

A BRIGA PELO IBOPE ENTRE BONI E GUGA, GANHOU AVANCINI

A Bandeirantes faz a festa e a Tupi ganha pontinhos

Os dois irmãos não se falam faz mais de seis meses. Não é por nada, não: é que Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho) é o chefão da Rede Globo e Guga (Carlos Augusto Oliveira), o irmão mais novo, agora tem o mesmo papel na Rede Bandeirantes. O trabalho não deixa.

Foi emocionante. A Globo e a Tupi (agora comandada por Walter Avancini, ex-lugar-tenente de Boni na aldeia global) anunciaram capítulos especiais das suas novelas-pratos-de-resistência - Pai Herói e Direito de Nascer, respectivamente. A grande batalha estava marcada para as 19h50m da última segunda-feira, quando a Rede Bandeirantes de Guga finalmente entraria na briga pelos pontinhos do IBOPE, apresentando nada mais, nada menos que Fernanda Montenegro em Cara a Cara, sua novela de estréia.

Era mesmo de se esperar que um novo lançamento tão promovido como Cara a Cara fosse capaz de movimentar os sonolentos seletores dos aparelhos de televisão do país. Ainda mais quando a disputa estava entre o final do insosso Jornal Nacional, na Globo, e a revelação de que Albertinho Limonta é filho de sóror Helena a mais manjada das revelações da nossa televisão.

Biônico incapaz - Esta briga pelos telespectadores, na verdade, foi decidida no horário anterior. Como comprovaram os índices de audiência divulgados pelo IBOPE no dia seguinte, Cyborg, "o homem de 6 milhões de dólares'', apesar de biônico, não conseguiu chamar o público para o horário das 19 horas. E quem começou a ver Aldo César fazendo propaganda subliminar do PTB (é notável a sua semelhança com o deputado brizolista Getúlio Dias), balbuciando, ao som de O Fortuna, do Carmina Burana de Carl Orff, que Albertinho Limonta é seu neto, continuou sintonizado na Tupi para ver Aritana.

Assim, na briga entre os irmãos Oliveira armados de Paulo Autran e Fernanda Montenegro, quem acabou ganhando foi Walter Avancini. A Globo perdeu quase 15 pontos no IBOPE de uma segunda-feira para outra (69.0 no dia 9; 54.3 no dia 16), mas isso pouco representou para a Bandeirantes, que passou de 2.7 para 5.0 no horário das 20 horas. Em compensação, a Tupi saiu de 11.7 no dia 9 para 20.3, justamente na estréia de Cara a Cara.

Guga, que passou o fim de semana trancado nos estúdios da Bandeirantes, às voltas com problemas de sonorização de Cara a Cara, não se mostra preocupado com os primeiros números do IBOPE. "Só dentro de noventa dias vamos poder avaliar os resultados. Nossa novela tem 160 capítulos e a Globo e a Tupi não têm 160 eventos especiais nas suas novelas para lançar, como fizeram na segunda-feira."

Indiferença global - Enquanto Guga ficava em sua sala do edifício Radiantes, no Morumbi, quase todo o elenco da novela, técnicos e assistentes rumavam em comitiva para a boate Ta Matete para assistir ao primeiro capítulo de Cara a Cara. Era o aniversário do diretor Jardel Mello e foi providenciado um imenso telão de umas cinqüenta polegadas para que todos pudessem se ver melhor.

Pelo entusiasmo demonstrado por esta seleta platéia, prorrompendo em aplausos a cada intervalo comercial, a novela não deixará de ser um sucesso, IBOPE à parte. Gritinhos de "Divina!" sempre que aparecia Fernanda Montenegro, ou de "Lindo!" para David Cardoso - a festa fazia lembrar um grupo de colegiais de volta das férias assistindo ao filme que fizeram. "Levamos mais de onze horas para fazer esta cena do caminhão", recordava um contra-regra.

Sem saber destas dificuldades todas, olhando atentamente para o aparelho de apenas dezessete polegadas no escritório do "núcleo das 18 horas", o diretor de Memórias de Amor, Sérgio Mattar, da Globo, assiste a Cara a Cara "por pura curiosidade". E conclui: "A continuidade está boa, o cenário muito bonito e Carmem Silva é uma atriz estupenda".

A sede da fábrica de novelas da Globo funciona numa casa da rua Lopes Quinta, um quarteirão acima da central da Vênus Platinada. O segundo andar, onde costuma ser encontrado o diretor Herval Rossano, está deserto. Na porta da sua sala, um aviso: "Estou na ilha quatro".

Marido e mulher - "Ilha quatro, no jargão global, é uma das unidades de videoteipe da Globo. As "ilhas" estão desertas, antes das nove da noite. Olhando fixamente para o close de Rosamaria Murtinho, com o script do capítulo 57 na mão, o editor de Pai Herói, Luís Paulo Cunha, elogia o trabalho do diretor da novela concorrente, Jardel Mello. Mas a Globo parecia definitivamente desinteressada com a festa de estréia da sua concorrente: até o oitavo andar, onde José Bonifácio de Oliveira Sobrinho tem sua suíte presidencial, estava completamente deserto.

A vida artística nesta segunda-feira estava mais animada no restaurante Alvarus, no Baixo Leblon, onde três atores da Globo conversavam com um grupo de jornalistas. "Esta história do Boni e do Guga está parecendo briga de marido e mulher. Eles se entendem, se transam, principalmente em jogadas como estas", diz um dos atores, contratado para o seriado Carga Pesada, com estréia marcada para maio, em substituição à novela das 22 horas.

Distante destas conversas, em sua mansão na Lagoa, Janete Clair, a rainha do horário das 20 horas, parece cansada e pouco preocupada com o rebuliço nas emissoras concorrentes. Nem viu o primeiro capítulo de Cara a Cara. "Foi por puro esquecimento. Trabalhei o dia inteiro e, como de hábito, liguei a TV na hora do Pai Herói." Também as críticas feitas ao seu último novelão parecem não atingi-la: "O público é quem manda e ele está gostando da história. Uma prova concreta disso: os 140 capítulos iniciais agora já vão ser 157".

Lento e gradual - Ao contrário do ambiente de indiferença da Globo, os corredores da sede da Tupi, no Sumaré, em São Paulo, estavam mais do que nunca movimentados na semana passada. ''Não é sempre que se têm idéias novas por aqui", comentou um velho funcionário da emissora, satisfeito com a volta de Walter Avancini, depois de dezesseis anos.

Os planos do novo chefão da Tupi são, como manda o figurino, lentos, seguros e graduais. Por enquanto, ele está mais preocupado em conseguir um aparelho de televisão para a sua sala - algo, com efeito, fundamental para ao menos saber o que está sendo produzido no Sumaré.

Em se tratando de Tupi, o gradualismo é mais do que conveniente. "Muita gente já quebrou a cara querendo resolver os problemas da emissora da noite para o dia", lembram os assessores de Avancini. A última vítima, como se sabe, foi o próprio Guga.

Apesar de todos os cuidados, os planos do novo ocupante do oitavo andar do Sumaré - sempre o oitavo andar. . . - até que são bastante arrojados. Seus olhos chegam a brilhar quando fala numa "televisão que crie um novo comportamento no público, distante dos modelos americanos e europeus, ''com características estritamente brasileiras, sem enlatados e com muita produção própria".

Além de 6 milhões de dólares em novos equipamentos, comprados da Boch, na Alemanha, e da inauguração de uma nova antena no Sumaré, Avancini conta com uma outra arma para enfrentar seu ex-chefe Boni: a criação de um novo horário de telenovelas, às 21 horas. A Tupi e a Bandeirantes, embora disputem um honroso segundo lugar, simplesmente ignoram: ambas, só pensam, só querem concorrer com a Globo.

Novela progressista - "Não será uma novela convencional", garante o veteraníssimo Antônio Abujamra, diretor de novelas da Tupi. Em seu escritório, onde ainda paira o retrato de Assis Chateaubriand, parecendo prestar muita atenção na conversa, Abujamra revela o enredo bombástico de Gaivotas, ao mesmo tempo em que vai despachando com paciência os artistas de segundo time que querem um papel na novela.

"Tem tanta gente desempregada", explica, ''que só se a gente montasse Ben-Hur, Os Dez Mandamentos ou coisa do gênero daria para dar trabalho a todo mundo". Gaivotas, escrita por Jorge Andrade, deverá ir para o ar no dia 20 de maio. Será a história de um industrial progressista, que não só concede o aumento pedido por seus empregados como ainda os obriga a aderirem à greve, em solidariedade a seus colegas. E depois ainda vai cumprimentar o prefeito Tito Costa pela forma com que se conduziu na greve do ABC.

Fala-se em Ioná Magalhães e Tereza Rachel para os principais papéis femininos, mas de certo, por enquanto, sabe-se apenas que Luís Inácio da Silva não foi convidado para nenhum papel. Ah, sim, sabe-se também que um personagem importante será o frei Alberto, que fará grande sucesso entre as mulheres. O ator convidado para o papel já está lendo o livro As Cartas, do seu homônimo frei Beto, para ir-se familiarizando melhor.

Para substituir Aritana, a Tupi apresentará um compacto de O Espantalho, com Jardel Filho, Natália Timberg e Eduardo Tornaghi, enquanto prepara uma nova surpresa. O Cortiço, de Aluísio Azevedo. Desaparecerá, assim, o horário novelístico das 19h15m, que será ocupado com programas infantis até a entrada no arde um novo telejornal. O maior problema de Avancini, no momento, é encontrar um grande nome para o departamento de jornalismo. É que os últimos grandes nomes que ocuparam o cargo até hoje não receberam seus salários.

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 2511