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PUC-Rio
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Jornal/Revista: Jornal do Brasil Data de Publicação: 30/03/1996 Autor/Repórter: Vera Jardim
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BEIJINHO, BEIJINHO E THCAU!
Programas com a ''griffe'' Xuxa sofrem desgaste entre o público infantil
A criança hoje está muito mais para Pelados em Santos do que para Ilariê. Mandar beijinho através das gravações em creches eletrônicas, nem pensar! É pela onda da internet que a gurizada quer se comunicar. O jeito Xuxa de fazer programa infantil caiu de vez com a transferência de Angélica, 22 anos, do SBT para a Globo. As emissoras que ainda insistiam na fórmula, abandonada pela precursora há quatro anos - Xuxa agora se dedica aos musicais com brincadeiras, visando mais o público jovem -, perceberam que a criança está bem mais exigente.
A Globo - que não tirou o Xou da Xuxa do ar sem antes consultar uma pesquisa, que oficializava o desgaste do programa - não pensa em voltar atrás. Além do infantil diário, seguindo uma nova filosofia, Angélica fará um programa semanal - aos domingos - dirigido aos adolescentes. Antes de estrear em junho, na Globo, a apresentadora cumpre contrato com o SBT até final de abril. A partir daí, Sílvio Santos tira do ar o Casa da Angélica, última imitação do Xou da Xuxa exibido na TV, e substitui a apresentadora nos games TV animal e Passa ou repassa. Um senhor desfalque.
Angélica também admite o desinteresse do público por atrações do gênero, criado em 1983 por Maurício Sherman para o Clube da criança, na Manchete. No entanto, quer continuar fazendo programas infantis. "O método desgastou, não os programas infantis," acredita ela.
A grife Xuxa teve outras seguidoras: Mara Maravilha, Mylla Christie e Patrícia Nogueira, a Pat Beijo. O gênero pode estar démodé, mas as figuras de Xuxa e Angélica ainda funcionam bem, segundo o diretor de atendimento da W/Brasil, Ronaldo Gasparini. A agência - que tem a conta da Grandene, na qual Xuxa empresta sua imagem para a sandália Melissinha - não está reclamando de nada.
"Xuxa triplicou a expectativa de venda da sandália que era de um milhão de pares", explica Ronaldo, acreditando que hoje a criança busca mais programas educativos como os da TV Cultura.
"É nesse filão que vamos investir. O auditório, porém, deve permanecer", adianta Angélica, cuja intenção e unir um projeto da Globo a outro de Marcelo Tas, responsável pelo Castelo Rá-tim-bum da TV Cultura. "Cheguei a oferecer esse projeto ao Sílvio Santos, mas ele não queria mais investir em programas infantis", conta ela, Continuar trabalhando com criança foi um dos principais motivos que a fez trocar de canal. Além da empatia que tem junto a este público, antigos e novos produtos vão contar com o janelão do marketing da Globo. Não é pouca coisa.
Na tentativa de atrair mais comerciais infantis, as sósias da Rainha dos baixinhos "m sendo substituídas por produções educativas e cartoons. Mariane, do Tarde da criança da Record, foi a última derrocada. Eduardo Lafond, diretor de programação e operações da emissora, confirma o desgaste o modelo. "Contratei a Mariane apostando num resultado bom e não aconteceu", conta, acrescentando que, a partir de abril, a emissora muda o perfil qualitativo de seus infantis em busca de melhores resultados comerciais.
Não parece nada, mas a irreverência dos Mamonas Assassinas marcou um novo conceito na preferência da garotada. Os rapazes foram cogitados pela W/Brasil, antes da tragédia que os vitimou, para serem os ídolos também na área comercial. "Pensamos neles para um anúncio do chinelo Ridder infantil. Qualquer produto explodiria com eles", acredita o publicitário Ronaldo Gasparini, que lamentou não ter conseguido contratar os rapazes. Clichês à parte o psicoterapeuta e pediatra Alfredo Castro Neves não tira os méritos de Xuxa e Angélica. "Tanto uma quanto outra ainda têm um bom espaço nos programas infantis".
UMA NOVA ERA PARA OS PROGRAMAS INFANTIS - Seguidoras de Xuxa sentem necessidade de formatos originais
As crianças dos anos 90 estão cada vez mais críticas, principalmente devido à informatização, dizem os especialistas. Mas isso não quer dizer que elas não precisam mais de um ídolo. "Faz parte da natureza humana personificar um mito para estimular a imaginação", acredita o psicoterapeuta infantil Christian Gauderer.
Mas o que pensam as seguidoras de Xuxa, cuja tendência é buscar novos caminhos? Para Mara Maravilha, que comandou o Show Maravilha no SBT durante sete anos, a televisão sentiu necessidade de inovar. Convertida à religião evangélica, a baiana filosofa sobre a nova fase profissional: "Se a figueira não está dando mais frutos, a gente tem que arrancá-la e plantar uma nova semente", acredita.
A partir de abril, Mara passa a comandar um programa infanto-juvenil na Record. De volta à TV, após dois anos, a artista não acha que sua imagem esteja desgastada, mas sim o formato do programa que apresentava. Mara garante que o novo trabalho, ainda sem título, terá características diferentes. "Estamos pensando mais em unir o público infantil e adolescente." Í
Afastada no mês passado da TV Record, a apresentadora Mariane, 23 anos, discorda do ponto de vista de Mara. "Acho que a criança também tem a necessidade de se distrair com um programa totalmente descompromissado, onde ela só precisa se divertir." Mariane não vê o fim da era Xuxa. "Acredito que ainda existe uma grande demanda por parte das crianças para este tipo de programa."
A apresentadora, que começou no SBT em 1989, passando pela CNT e pela Record, espera agora novas propostas e não descarta a possibilidade de apresentar um outro tipo de programa. "Mas se eu pudesse escolher, continuaria a trabalhar do mesmo jeito com o público infantil."
Patrícia Nogueira, a Pat Beijo, que por um ano e meio apresentou o Clube (ta criança, na Manchete, confessa que gostava mais de exercer o papel de apresentadora infantil. Já o formato do programa não a agradava tanto. "Eram apenas brincadeiras e merchandising de produtos'', conta Pat Beijo. "Nesta era de informatização, a criança está ficando mais criativa e inteligente. Ela não aceita qualquer tipo de programa." A saída de Pat da Manchete não inibiu sua carreira. "Se eu voltar a trabalhar com crianças, quero fazer um programa mais educativo, que as faça pensar."
AS NOVAS ATRAÇÕES INFANTIS - Seguindo o filão da TV Cultura, a Record está investindo US$ 1 milhão em novas aquisições como O mundo de Beakman. "Compramos episódios inéditos que a Cultura não pôde adquirir." Fazem parte ainda do investimento, originais colorizados de filmes do Zorro, os desenhos Gato Félix e Garfield, além do Agente G, que passa a ser exibido a partir de 15h. A CNT segue o mesmo caminho, investindo US$ 4 milhões num programa produzido pela equipe responsável pelo Castelo Rá-tim-bum da Cultura. "A previsão de estréia é a partir do segundo semestre" diz José Carlos Martinez, dono da emissora curitibana. A Manchete também investe numa nova programação infantil. A partir de abril, resgata os velhos e ingênuos Nacional Kid e Ultra-man e transforma o filme O menino maluqüinho de Ziraldo em série.
EDUCATIVOS NA MIRA DA PUBLICIDADE - A criança, hoje, divide a audiência noturna com o adulto na mesma proporção, afirma o Ibope (Instituto Brasileiro de Pesquisa de Opinião e Estatística), Na opinião de Flávio Ferrari, diretor comercial do instituto, o desvio de audiência dos canais abertos para os de cartoon, por assinatura, ainda não é significativo. "A audiência das TVs fechadas passou, ano passado, de 1% para 5% na grande São Paulo. Esse pequeno desvio, porém, é da classe A."
Segundo Flávio, até o final de 1996, o Ibope deve iniciar o trabalho de medição de audiência das emissoras por assinatura, em fase de crescimento. Ele atribui aos educativos da TV Cultura os maiores índices na categoria infantil.
A comercialização por faixa de horário varia muito em função do produto. A audiência do telespectador mirim pela manhã, no entanto, chega a 60% contra 40% à tarde. "Avaliamos o tipo de produto e de consumidor para melhor adequação", explica Carlos Alberto Parente, presidente da agência Better de publicidade, que detém a conta dos brinquedos Estrela. Percebendo a mudança do perfil desse consumidor improdutivo, mas nada desprezível, a Better aguarda os resultados de uma pesquisa encomendada recentemente.
A tendência no mercado, segundo Ronaldo Gasparini da W/Brasil, são os educativos. Ele lamenta a lei que proíbe a veiculação de comerciais em emissoras estatais como a Cultura. "A gente sente falta dessa mídia. A TV Cultura, no filão de programas educativos, continua imbatível."
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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 31778