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Jornal/Revista: Jornal do Brasil
Data de Publicação: 29/09/1985
Autor/Repórter:

JB E HAVELANGE ADQUIREM 80% DA TV RECORD DO RIO

Depois de quase seis meses de negociações, está concretizada a compra, pelo Sistema Jornal do Brasil e pelo Presidente da FIFA, João Havelange de parte de Sílvio Santos na TV Record. Os novos sócios adquiriram, dessa forma, 80% do controle da TV Record do Rio, além de 50% de cada uma das seguintes emissoras: TV Record de São Paulo, TV Record de São José do Rio Preto, TV Record de Franca e Rádio Record (AM e FM).

Por um acordo dos acionistas, eles controlarão, na prática, 50% da Rede Record. A metade restante permanece com o outro proprietário, Paulo Machado de Carvalho: "As negociações não foram difíceis e transcorreram num clima amistoso. Além disso consideramos uma felicidade termos Paulo Machado de Carvalho como sócio. O relacionamento, com certeza, será excelente. A par do seu gabarito e competência, ele é do ramo, onde já tem uma longa tradição adquirida" - diz o Diretor Executivo do JORNAL DO BRASIL, J.A. do Nascimento Brito.

A compra - Os entendimentos começaram em abril. O JORNAL DO BRASIL contratou Paulo Possas para fazer os entendimentos iniciais. Ele era o principal executivo do Grupo Bonfigliolli, de onde saiu para formar sua própria empresa de intermediação de negócios e gestão de patrimônio.

- De nossa parte - comenta J.A. do Nascimento Brito - a principal característica da negociação foi uma extrema cautela. Tivemos muito cuidado ao ponderar todos os aspectos envolvidos.

Entre os dias 22 e 25 de julho, dois executivos da Televisa do México visitaram as instalações da TV Record a pedido do JORNAL DO BRASIL. Alejandro Meza, Diretor Técnico de Operações, e Jesus Lozano, Vice-Presidente de Finanças da empresa mexicana, vieram fazer uma avaliação da emissora que se pretendia vender.

- A grande amizade de João Havelange com Emílio Ascárraga, um dos principais acionistas da Televisa, fez com que, no decorrer das negociações, os dois técnicos da empresa mexicana viessem avaliar os ativos do negócio. Queríamos uma avaliação independente e descobrimos que a Record está bem montada quanto aos seus equipamentos de transmissão. Há apenas uma certa deficiência em relação ao equipamento de áudio - conta o Diretor Executivo do JORNAL DO BRASIL.

No dia 28 de agosto, houve uma importante reunião, quando as principais bases do negócio foram montadas. Participaram o Presidente do Grupo Sílvio Santos, Luís Sebastião Sandoval, o controller do Grupo, Bezerra Leite, Paulo Possas, além de J.A. do Nascimento Brito e João Teodoro Arthou. Vice-Presidente das Empresas Coligadas do Sistema JORNAL DO BRASIL.

Na quinta-feira, 19 de setembro, uma série de telefonemas praticamente acertou a transação. Na última terça-feira, dia 24, houve uma última reunião, na sala de J.A.do Nascimento Brito, para finalizar o negócio, e finalmente às 17h da última quinta-feira, num "encontro muito amistoso", segundo o Diretor Executivo do JORNAL DO BRASIL, a compra foi sacramentada na casa de Sílvio Santos, no Ibirapuera, em São Paulo. Estiveram presentes, além dos dirigentes que participaram das reuniões anteriores, e do próprio Sílvio Santos, o Diretor-Presidente do JORNAL DO BRASIL, M.F. do Nascimento Brito, e os diretores do JORNAL DO BRASIL em São Paulo, Mauro Guimarães e Armando Figueiredo.

Os novos sécios - J.A. do Nascimento Brito esclareceu que o JORNAL DO BRASIL e o empresário João Havelange, que entraram no negócio com partes iguais e adquiriram a metade do Sistema Record, são os dois únicos novos sócios:

- Pelos riscos e pela própria grandeza do negócio, não queríamos arcar sozinhos com o empreendimento. Preferimos ter um sócio, e Havelange, por ser um empresário muito bem-sucedido em empresas como a Cometa e a Orvec, onde é importante acionista, se encaixou muito bem em nossos propósitos. Creio que será uma união empresarial bem-sucedida. Os recursos para a compra da Record vieram exclusivamente do empresário João Havelange e dos acionistas (pessoas físicas) do JORNAL DO BRASIL. Quanto a nós, não vamos carrear recursos das outras empresas do sistema para o novo empreendimento.

Em relação à Televisa, J.A. do Nascimento Brito explicou que o "relacionamento do presidente da Fifa, com os dirigentes da rede mexicana, foi fundamental para a vinda dos técnicos. A Televisa está muito ligada ao futebol. Ela é dona de 12 estádios, a começar pelo próprio Estádio Azteca, que a empresa construiu para a Copa de 1970. Além de Ascárraga, outro importante executivo da Televisa, Guilherme Cañedo, que cuida basicamente do futebol, também tem grande amizade com Havelange. Isso explica a vinda dos técnicos. É nesse episódio que se resume o papel da Televisa em todo o transcorrer das negociações.

Interesse - O Diretor Executivo do JORNAL DO BRASIL observa que o interesse da empresa por uma emissora de TV é antigo e vem desde a década de 50: "E não entramos antes no negócio TV unicamente por razões políticas. No Governo JK, não recebemos a concessão, que estava bem encaminhada, por causa de uma foto em que Juscelino aparece de mão estendida para o então Secretário de Estado dos Estados Unidos, John Foster Dulles. Na época de Jânio Quadros, quando estávamos na iminência de receber um canal, houve a renúncia. Com João Goulart tivemos conversações, mas sem resultados. No período Emílio Médici ganhamos a concessão do canal 9, mas nos empurraram para Niterói, sob a alegação de que o antigo Estado do Rio precisava de uma emissora".

O JORNAL DO BRASIL precisava também de um canal em São Paulo, para formar a rede, e que foi concedido logo no início do Governo Ernesto Geisel. Em 76, no entanto, o JORNAL DO BRASIL criticava a política estatizante do Governo: "Sofremos um intenso boicote econômico em relação às verbas de publicidade. As empresas eram pressionadas a nos boicotar. Queríamos importar equipamentos de pré-impressão, mas a. operação foi brecada. Sofremos até pressão sob a forma de uma auditoria do Imposto de Renda. Os auditores ficaram meses aqui dentro."

Credibilidade - Diante do quadro criado, quando se esgotou, em setembro de 78, o prazo para colocar a rede no ar, M.F. do Nascimento Brito, decidiu devolver a concessão. "Com esse gesto", afirma J.A. do Nascimento Brito, "mostramos o caráter de nossa empresa e demos uma bofetada no Governo. A credibilidade e a independência constituem o nosso principal patrimônio. Estávamos debaixo de um tremendo boicote e diante do investimento necessário para a televisão, era muito temerário nos movimentarmos nesse clima. Assim como havia feito com a maquinaria do jornal, o Governo também poderia brecar a importação dos equipamentos para a televisão".

O JB continuou, no entanto, em busca de sua rede. "O episódio da TV Tupi ilustra mais uma vez, o mesmo tipo de situação. O JORNAL DO BRASIL e a Editora Abril, depois de chamados pelo Governo para participar da concorrência, foram punidos por razões políticas. Nenhuma das duas empresas eram consideradas "confiáveis" politicamente e por isso não ganharam a rede. O interessante é que o Governo nos chamou alegando sua preocupação com a Rede Globo, que estava "grande demais". Creio ter sido até uma sorte para nós não termos ganho. Fizemos importantes mudanças internas e conseguimos diversificar o Grupo. Hoje a parte do jornal no total de nossa receita representa muito menos do que as pessoas imaginam. Atingimos uma solidez administrativa e gerencial invejáveis. E nos preparamos para os novos passos empresariais, como nunca havíamos nos preparado antes".

Novos tempos - O Grupo resolveu desistir da televisão enquanto perdurasse o regime militar - diz o Diretor Executivo do JORNAL DO BRASIL: "A Nova República, que trouxe uma mudança de ambiente, de atitudes e do caráter das pessoas, nos deu a margem de segurança necessária para que voltássemos a perseguir nosso objetivo".

- A televisão nos completa. Nós sofremos a mais brutal concorrência de que se tem notícia no Brasil, pelo próprio mérito do Sistema Globo. Mas a ausência de uma rede de TV torna desproporcional essa competição. A democracia no Brasil passa pelo problema da TV brasileira.

E por que a TV Record? "Foi uma questão de oportunidade. Sabíamos que Sílvio Santos acabaria vendendo a sua parte. Dificilmente continuaria com as duas redes. E embora contasse com uma audiência bem arrumada, não recebia a atenção prioritária do Grupo, que se concentrava na TV Studios. É como se estivesse e não estivesse no ar ao mesmo tempo. Ela existe, mas nós a podemos moldar.

E o que se pretende com a TV Record? "Temos idéias, mas elas ainda vão ser amadurecidas. Nossa prioridade imediata é continuar mantendo o melhor relacionamento possível com nosso novo sócio, Paulo Machado de Carvalho, responsável por uma época áurea da televisão brasileira, na década de 60. Nos orgulhamos dessa sociedade".

Outra prioridade é a conclusão dos trâmites burocráticos necessários à assinatura definitiva do contrato, num prazo previsto de um mês. As partes já trocaram cartas confirmando a aceitação das bases propostas: "Por enquanto, no desdobramento dessa última fase burocrática eu e o João Teodoro Arthou seremos os dois únicos executivos do Sistema JORNAL DO BRASIL a cuidarmos da TV Record. Depois, quando precisarmos, vamos procurar profissionais no mercado. Não pretendemos deslocar para a televisão os executivos do nosso sistema".

O preço final será divulgado ao final desses trâmites burocráticos: "A mesma cautela que nos levou a negociar com muito cuidado nos leva a entrar no mercado também com a máxima atenção. Os riscos são enormes, sem caminho de volta, se errarmos. A Globo e o Sílvio Santos são muito competentes. A Globo é uma grande televisão e uma grande empresa".

"Gastamos 1 milhão e meio de dólares estudando e pesquisando televisão nos últimos anos. Temos já algumas diretrizes. Não pretendemos, por exemplo, concorrer nas faixas D e E. Queremos dar ênfase ao jornalismo, mas ainda não chegamos aos detalhes".

As pesquisas demonstram também, segundo J. A. do Nascimento Brito, "que o mercado de anunciantes e das empresas de publicidade quer novas opções. A própria competência da TV Globo, tanto na programação quanto na comercialização, acabou gerando algumas distorções".

- Existe uma enorme expectativa de sucesso do Grupo, quanto ao novo veículo. Nossa responsabilidade institucional é grande e pesa. Mas nosso projeto não é para fazer milagres do dia para a noite. É a longo prazo, sem a pretensão de achar que podemos competir imediatamente. Estamos de pés no chão.

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 5893