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Jornal/Revista: Valor Econômico
Data de Publicação: 30/01/2003
Autor/Repórter: Robinson Borges

MANOEL CARLOS É A ESPERANÇA DA REDE GLOBO

Autor de "Mulheres Apaixonadas", novela que estréia no dia 17, foi escalado para elevar audiência das 20h.

Assim como o escritor D.H. Lawrence (1885-1930), o dramaturgo Manoel Carlos é um um homem devotado ao universo feminino e, por isso, escolheu o título de um livro do autor britânico para sua próxima telenovela das 20h30, "Mulheres Apaixonadas". Com estréia marcada para o dia 17, na Rede Globo, a história dirigida por Ricardo Waddington terá um toque bem mais suave do que Lawrence - um escandaloso em sua época - ao traçar vários perfis de mulheres enredadas pelo amor.

"Mulher e amor são duas das muitas molas do mundo, ao lado do dinheiro e do poder. Essa novela terá várias histórias que se cruzam, procurando situações do cotidiano, algumas bem banais. Não há nenhuma pretensão, a não ser entreter e - se possível - despertar alguma reflexão", afirma Manoel Carlos.

Para alguns críticos, o autor é, de fato, o rei da crônica na teledramaturgia, assim como Benedito Ruy Barbosa é o do épico, Agnaldo Silva do realismo fantástico e Sílvio de Abreu da comédia e do policial. Manoel Carlos concorda com o título e o define como estilo.

"Faço uma crônica diária sobre o cotidiano de uma pequena parcela da classe média, morando no Leblon. Bem simples e corriqueira. Minha influência é essa: a vida cotidiana, a vida que vejo diariamente, andando e conversando com pessoas", analisa o autor de sucessos, como "Laços de Família", "Presença de Anita" - cujo DVD acaba de sair pela Globofilmes - e "Por Amor", que reprisada recentemente à tarde alcançou audiência superior às das novelas das 18h e das 19h.

A Globo aposta justamente em seu currículo bem-sucedido para tentar resgatar a audiência cotidiana perdida no horário nobre. Com uma série de problemas de produção, "Esperança", atualmente em exibição, tem uma das piores perfomances do horário. Para Manoel Carlos, o detonador da crise da atração foi a data da estréia, "realizada contra todas as estratégias conhecidas por quem é do ramo".

"Colocar no ar uma novela em plena Copa do Mundo é desafiar todos os deuses. E eles são implacáveis. O horário político também desviou a atenção normal do público, pois a última campanha eleitoral foi atípica, quase um show de grandes atrações. Isso retardou, provavelmente, a decolagem da novela", analisa.

Mesmo assim, o autor deve experimentar do mesmo veneno, estreando num momento pouco fértil para alavancar os índices do ibope: às vésperas do carnaval. "Tentei convencer a direção da Globo de que a data para a estréia não era a mais adequada. É sabido que o mês do carnaval proporciona mais riscos do que em outras épocas do ano. O mesmo acontece com dezembro, por conta do Natal", explica.

Como não conseguiu ser atendido em seu apelo, Manoel Carlos aposta fundo no seu estilo para reduzir a margem de risco da telenovela. Assim como em todas as suas obras, a protagonista se chamará Helena e será uma mulher com mais de 40 anos. Interpretada por Christiane Torloni, a Helena da vez enfrentará sua grande crise existencial depois de 15 anos de casamento com o músico Théo (Tony Ramos), quando resolve viver uma nova paixão com seu ex-namorado, César (José Mayer).

Mas essa é apenas a espinha dorsal da sinopse, explica o autor. Por sua longa duração, Manoel Carlos defende também a abordagem de temas ditos polêmicos para que a novela se sustente no ar. "Há que instigar, provocar, fazer com que cada capítulo transborde para as conversas do dia seguinte, na escola, no trabalho, na rua. Sem isso, sem o comentário do dia seguinte, uma novela não decola", acredita Manoel Carlos.

Eleitor declarado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o dramaturgo pode recorrer às mudanças do novo governo para dar um ar atual e estimular o debate em sua história. "Como a novela que escrevo fala do dia-a-dia de pessoas comuns, terei a oportunidade de tocar em assuntos de política e administração do país. Nenhum proselitismo, claro, como nada partidário", afirma.

E qual sua opinião sobre o presidente? "Levo muita fé. É um homem de nobres intenções, que conhece os principais problemas do povo brasileiro. Mas temo por sua ingenuidade ao tratar com as raposas e os lobos que fazem política. Os políticos profissionais. Mas torço por ele, declaradamente", observa.

A política, entretanto, estará apenas a serviço das muitas outras histórias da novela, todas circunscritas ao círculo familiar, também como nas obras anteriores do autor. São relações de pais e filhos, irmãos, marido e mulher. Haverá espaço ainda para merchandising social, em que tratará dos problemas da terceira idade. "Serão dois personagens, mostrando como os idosos são relegados a um plano inferior no nosso país", explica o escritor.

O elenco tem várias estrelas globais, como Suzana Vieira, Rodrigo Santoro, Giulia Gam, Regina Braga, Natália do Vale, Cláudio Marzo, entre outros. Todos os atores foram selecionados pelo próprio autor. "Eu só começo a escrever quando tenho o elenco escolhido. Não escrevo aleatoriamente. Preciso ouvir a voz do intérprete, enquanto escrevo o que ele vai dizer", diz.

Na contramão de autores, como Benedito Ruy Barbosa, Glória Perez e Lauro César Muniz, que defendem um único escritor para manter a "aura autoral" das novelas, Manoel Carlos diz que o importante é ter a capacidade de supervisionar a obra.

"Para uma novela ser autoral não é preciso que o sujeito escreva sozinho. Basta que ele tenha o controle da ação e dos personagens. Se criou cada um dos papéis e estabeleceu seus perfís, escrevendo sozinho os primeiros capítulos, a novela é dele", comenta o autor. "Um colaborador precisa antes de tudo ser um profissional leal e ético. São pessoas importantes na caminhada da novela, pois servem também como interlocutores privilegiados do autor", prossegue.

Segundo Manoel Carlos, a Rede Globo lhe concede liberdade para o total controle das novelas. Ele participa integralmente da produção, da escolha do elenco, da trilha sonora, dos figurinos e até dos cortes de cabelo dos atores para que o tom do personagem seja o mais adequado possível. "Divido essas tarefas com o diretor Ricardo Waddington, que está vivendo comigo a quinta parceria. Formamos uma dupla que se admira e se respeita mutuamente. Quanta à sinopse, essa é de minha total e exclusiva autoria e responsabilidade. Afinal, a novela é minha", afirma.

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 85331