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Nova Consulta

Jornal/Revista: Folha de S. Paulo
Data de Publicação: 19/07/1989
Autor/Repórter: Sônia Apolinário

NOVELA REVÊ BOEMIA DO RIO DOS ANOS 30

A novela "Kananga do Japão", de Wilson Aguiar Filho, estréia hoje, às 21h30, na Rede Manchete. A direção é de Tizuka Yamasaki, Carlos Magalhães e Jayme Monjardim, o diretor artístico da emissora. Foi o .próprio presidente das empresas Bloch, Adolpho Bloch, quem deu a ideia de se fazer uma novela que mostrasse o Grêmio Recreativo Familiar Kananga do Japão - um famoso cabaré que existiu no Rio, na década de 30 -, do qual fora assíduo frequentador.

Carmen Miranda e Manuel Bandeira, entre outros, também visitaram o cabaré que funcionou na praça 11, perto do cais do porto. Ele é o cenário onde se desenvolve a trama central da história: o triângulo amoroso vivido por Dora (Christiane Torloni), Alex (Raul Gazolla) e Danilo (Giuseppe Oristanio). Como pano de fundo da novela, a vida política e cultural do Brasil na década de 30.

A história começa no dia 3 de janeiro de 1930. Nessa data, Getúlio Vargas lançou a plataforma da Aliança Liberal, num discurso realizado no Castelo, no Rio. O fim chega com a declaração da Segunda Guerra Mundial, na Europa, em 1939. No Brasil, a data marca a demolição da Kananga, determinada pela necessidade de alargamento da avenida Rio Branco.

Personagens fictícios contracenam, na novela, com personalidades históricas. Getúlio e' Benjamin Vargas, Plínio Salgado, Luís Carlos Prestes e Pixinguinha farão algumas "pontas". Esses personagens podem aparecer, também, em imagens de época. Cada capítulo terá cerca de três minutos de imagens documentais fundidas com as imagens da novela.

O escritor Wilson Aguiar Filho faz questão de frisar que a história de "Kananga" é "antes de tudo, romântica". Os "personagens reais" aparecem em função dos personagens fictícios. Por exemplo, Henrique (Paulo Castelli) é um tenente da Aeronáutica, comunista e amigo de Luís Carlos Prestes. Ele acaba morto na Ilha Grande, depois de dividir uma cela com o escritor Graciliano Ramos.

A Manchete aposta o futuro da sua atividade na área de teledramaturgia com "Kananga". E a aposta é alta. A novela é uma superprodução cujo custo é mantido em sigilo, na emissora. O que seus diretores não escondem é que querem conquistar o público não só através da história. Eles querem "encher seus olhos" com cenas plasticamente bonitas. Por isso, escolheram a cineasta Tizuka Yamasaki para dirigir a novela, apesar de ser uma estreante no gênero.

A diretora, porém, avisa que ninguém deve ligar a televisão na esperança de ver cinema. "Estou fazendo novela e do modo mais simples possível. Nem eu nem a Manchete tivemos tempo e dinheiro para reinventar a linguagem da TV. Estamos fazendo uma novela bem-feita, divertida, que mistura drama, documentário e musical", disse ela.

O principal investimento da Manchete foi a construção da cidade cenográfica e a reforma dos estúdios em Água Grande, no subúrbio do Rio. A cidade fica em Grumari (35 km do centro). Tem 5.600 metros quadrados de área construída e reproduz a praça 11 carioca da década de 30 através 32 fachadas de prédios e sete ruas, com direito a bonde com 200 metros de trilho. Nos estúdios, foram construídos 12 cenários fixos. O maior deles mostra o interior da Kananga e ocupa uma área de 100 metros quadrados. Nele, gravam, em média, 50 pessoas ao mesmo tempo, entre atores e figurantes e uma orquestra de sete músicos que toca ao vivo.

A gravação da novela começou em maio, nos estúdios, e em julho, na cidade cenográfica. O elenco de 25 atores já trabalha desde abril. Naquela época começaram a receber aulas de dança e etiqueta ministradas, respectivamente, pelas professoras Sandra Regina e Yolanda Fernandes. Os atores aprenderam a dançar, entre outros ritmos, gafieira, maxixe e foxtrote. A ala dos "malandros" aprendeu também capoeira com José Tadeu Carneiro, o Mestre Camisa, e sinuca com Gilberto Piquiri. O núcleo dos judeus está sendo assessorado pelo cantor litúrgico Alberto Burzstein. Algumas cenas serão todas faladas em iídiche, traduzidas por legenda.

Para que a década de 30 seja reproduzida nos mínimos detalhes, a Manchete comprou e recuperou cinco carros Ford, modelo 1929, além de alugar um avião biplano, modelo Waco. Foi importada uma linha de produtos de maquiagem da linha Dior francesa, específica para cinema e TV, cujas tonalidades se adaptam à iluminação, mantendo a cor exata da época.

Todo esse visual será embalado por uma trilha sonora criada por Guto Graça Mello. O ex-homem das trilhas da Globo atualizou 14 versões de músicas que marcaram os anos 30. O coral Garganta Profunda, por exemplo, regravou "Coisas Nossas", de Noel Rosa. Luís Melodia, Ângela Ro Ro e grupos de rock também fizeram suas versões de Lamartine Babo e Ari Barroso, entre outros.

CABARÉ FICOU NO FOLCLORE DO RIO - A verdadeira Kananga do Japão foi criada no Rio de Janeiro em 1914 e se chamava Sociedade Dançante Familiar e Rancho Carnavalesco Kananga do Japão. O cabaré ficava perto da Praça 11 e era frequentado pelos imigrantes italianos, judeus e pelos negros entre os anos 10 e 30.

A Kananga do Japão entrou para o folclore carioca por ter criado regras de comportamento. Seus proprietários, temendo possíveis brigas entre os frequentadores de baixo nível cultural, criaram os "Estatutos da Gafieira", cujos princípios eram rigorosamente observados por um fiscal de salão.

QUEM É QUEM NA KANANGA

. Dora (Christiane Torloni) - Filha de uma aristocrática família paulista que, falida, se mudou para Rio. Vai trabalhar como bailarina da Kananga. Lá, conhece o cafetão Alex, por quem se apaixona. Mas vai se casar com Danilo.

. Alex (Raul Gazolla) - Filho do dono da Kananga. Um cafetão que tem muito carinho pelas suas prostitutas, Capoeirista, malandro, amante da vida. Tem muitas mulheres. Uma delas será Letícia, mãe de Danilo.

. Letícia (Tônia Carrero) - Mulher esnobe e mal amada. Casada com o industrial Chico Viana (Carlos Alberto). Sua pose cairá por terra ao se apaixonar pelo cafetão Alex, com quem manterá um romance.

. Danilo (Giuseppe Oristânio) - Filho de um famoso industrial. Corredor de automóvel, começa a despontar como uma das maiores revelações da temporada. Terá um filho com Dora.

. Juarez Távora (Paulo Gorgulho) - Personagem histórico. Militar revolucionário que participou da Coluna Prestes. É preso ao ser acusado de conspiração contra o regime do presidente Washington Luís, em 1929.

. Tenente Henrique (Paulo Castelli), Olegário Maronha ( Chico Diaz) e Jorge (Ruy Resende) - Personagens fictícios. Fogem junto com Juarez Távora da fortaleza de Santa Cruz. Participam, com o militar, da Revolução de 30.

. Luly Kelly (Zezé Mota) - Uma das cantoras da Kananga.

. O Conselho das 7 de Kananga do Japão - Juca (Haroldo Costa), o presidente de honra; Alex (Raul Gazolla), filho de Juca; Caveirinho (Nelson Xavier), bicheiro; Saralva (Ewerton de Castro), sambista e bicheiro; Noronha (Cláudio Marzo), dono de um jornal sensacionalista; Saul (Sérgio Viotti), judeu imigrante do início do século; Orestes (Carlos Eduardo Dolabella), policial.

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Fonte: Banco de Dados TV-Pesquisa - Documento número: 9750